CHUVAS E ENCHENTES
A tragédia de Petropolis me faz lembrar um dia,no inicio dos anos 70,quando fui morar em São Paulo,recém-casada e sai para um a entrevista de emprego.
Chovia muito, desde a madrugada e em determinado ponto do percurso as ruas estavam alagadas e havia uma espécie de enxurrada .O condutor do onibus parou o veiculo e ali ficamos,não lembro por quantao tempo, Eu estava já voltando da entrevista e me resignei,não havia o que fazer, ele não podia continuar. As pessoas começaram a conversar dentro do veiculo e alguém atrás de mim comentou que tinha de chegar em casa porque deixara os filhos sozinhos .E não dava paa descer e andar porque estávamos dentro d agua ( o veiculo,claro). Acreditem, passaram-se horas ,tivemos que esperar que houvesse uma especie de escoagem de tanta agua para que o condutor pudesse buscar outras vias .
Meu destino era a casa de uma amiga que nos acolhera na cidade e onde eu passava parte de meu dia enquanto me preparava para entrevistas de emprego. E lá tabém iria me encontrar com meu esposo, que já havia conseguido um emprego. Quando cheguei, já a noite, ele já estava lá e, pasmem,meio que irritado por minha demora como se eu fosse a culpada pelas chuvas que alagaram a cidade.Foi necessário nossa amiga lhe dizer que quando acontecia isso,ninguem voltava para casa cedo além de que mesmo em condiçõies normais,ninguem voltava cedo pra casa em São Paulo. Ele teve que engolir e disse apenas:" Vamos para casa". A nossa amiga ainda tentou nos dizer que iria ser dificil chegar lá(-moravamos em uma região de Sampa bem mais baixa do que onde estávamos. Mas ele disse que iriamos embora. Pagou feio porque ao começarmos a descer uma especie de ladeira entre a parte alta e a baixa, vimos logo como estava o imenso parque a nossa frente. entre nós e nosso bairro.
Ele resolveu encarar e fui na onda. A agua alcançava nossos joelhos e não tinhamos ideia onde e no que estavamos pisando, só imaginávamos que deveria ser em muita coisa suja já que o parque era um logradouro de frequencia assidua e transito intenso .E era um local de passagem ininterrupta de trabalhadores de várias areas na cidade.
Para mim foi uma aventura aquela multidão atravessando o parque com agua até os joelhos. Meu esposo demorou a relaxar( um pouco) até que olhou para o alto e viu os viadutos lotados de veiculos parados e imaginou( e verbalizou) aquilo tudo desmoronando. Eu ainda ousei argumentar que era concreto pesado, bem construidos( e ainda estão lá até hoje) e que não desabavam assim, por causa de acumulos de veiculos. Só ouvi quando ele resmungou:" praga de cidade!"
Chegamos ao nosso destino e havia um homem deitado na porta do predio onde moravamos coberto por jornais.Confesso que foi a primeira vez que vi um morador de rua.Sou do Norte e em 1971 esse ainda era um fenomeno proprio de grandes capitais. Hoje em dia, aqui na minha cidade, é paisagem social.
Moravamos em um predio dividido em kitnets , separadas por paredes de compensado, ( alguem me sugeriu,posteriormente, que eu morara em um cortiço-mas isso nunca me incomodou) e desejar silencio absoluto era impossivel e nessa noite,mais impossivel ainda porque os moradores só se preocupavam em dormir e as aguas subirem mais.
Ninguem dormiu, na verdade, a maioria ficou na vigilia. Lembro de ter dado uma cochilada.Pela manhã , já prontos para sair novamente para nova jornada ,ele no trabalho e eu em busca de um, qual não foi nossa surpreza ao vermos a rua já sem agua. Fiquei impressionada com a rapidez com que alagou e como, pela manhã estava apenas umido.
Os vizinhos moradores a mais tempo na cidade nos disseram que aquilo era comum na estação das chuvas.
Meu esposo então resolveu que não ficariamos em Sampa, não era lugar para ele. Pensam que ele me perguntou a opinião? Dias depois já veio com as passagens de onibus avisando a data .Mas eu queria ficar. Se tantos moravam e enfrentavam a Natureza por que não podiamos fazer o mesmo? Lembro de ter chorado .
E agora diante da tragedia de Petropolis,com tantos mortos e desaparecidos volto áquele dia e penso na sorte que tivemos em não ter sido o fenomno das chuvas bem mais perigoso naquele dia.