Nobre vagabundo 🔵
Seres imaginários, habitantes de um universo paralelo, apenas quem não quer nada ou aqueles que ousam romper com a sociedade.
O Homem do Saco parecia ser tudo isso. Saído diretamente de alguma mente fértil ou de algum conto dos Irmãos Grimm, esse personagem foi inventado pelos antigos para assustar crianças. Segundo a lenda urbana, esta figura raptava as crianças, colocava num saco e sumia no mundo. Coisa leve para ameaçar o próprio filho. O andarilho estava personificado e parecia bem real, porque ele aglutinava as mazelas brasileiras numa pessoa só. Todo o temor atribuído a tão triste figura era injusto. Tinha uma barba de anos, cabelos desgrenhados e uma cor amarelada, dos pés à cabeça, devido a uma duradoura falta de banho. Eu nunca o vi ameaçando ninguém, confesso que até me causava dó. O sujeito tinha o azar de carregar um velho saco de estopa nas costas. Isso era o suficiente para corroborar a antiga lenda, apavorando a sociedade. Ele tinha um olhar triste, mas não uma tristeza com os rumos dele e sim da Humanidade.
O Bráz* não poderia ter o nome mais apropriado. Negro, cabelos brancos, aparência de um “Preto Velho”, carregava, como uma maldição, várias mazelas brasileiras: trabalhava o dia inteiro e, no caminho de casa, enchia a cara, ficando muito louco. Era fácil identificá-lo, lá no fim (e no meio) da rua ele vinha gritando: “ó”. Nunca o vi pronunciar outra coisa. O Bráz morreu atropelado por um ônibus no fim da rua onde eu morava. Provavelmente, ele estava no meio da rua e gritando “ó”.
Fuscão Preto, não se sabe de onde vinha, para onde ia ou o que fazia. Um dia, ele “colou” na turminha e cantou a música “Fuscão Preto”, do Almir Rogério. Pronto, foi o suficiente para a molecada cair na gargalhada e o sujeito sair de lá batizado.
O Lokinho da Lata* era o único maluco que não era beleza. Acho que era louco patológico, do tipo que necessitava de intervenção manicomial. Agressivo, esse cara transportava latas conseguidas não sei onde. Esse comportamento impedia qualquer aproximação, sob o risco de ser alvejado por uma embalagem de extrato de tomate Elefante ou de ervilha Jurema.
Eu me lembro de algumas figuras que tiveram uma passagem fugaz e, aparentemente, sem importância. No entanto, por mais rápida e repelente que a simples presença representava, eles geraram reflexão sobre a vida... e esta crônica.
* Bráz e Lokinho, tomei a liberdade de escrever da maneira que eu imaginei.