Na época do governo Collor eu namorava Eliseu. Ele foi o amor da minha vida. Pedro Collor já tinha feito as denúncias e país estava desmoronando. Collor então foi a televisão e convocou a população para ir às ruas usando as cores da bandeira do Brasil para defender a sua permanência como presidente. Aliás vou citar aqui um exemplo de democracia que não existe mais hoje: eu tinha votado em Lula e Eliseu em Collor e conviviamos sem nenhum problema, um respeitando a opinião do outro. Que saudades de um tempo onde o debate era saudável. Claro que não voto mais em Lula e para ser sincero nem em Bolsonaro. Por mim o Brasil se livrava dos dois para acbar com essa polarização ridícula.

          Acontece que o feitiço virou contra o feiticeiro e milhares de brasileiro foram às ruas com o rosto pintado de preto, verde e amarelo, pedindo exatamente o contrário que era a saída de Collor. Como universitário e atuante no movimento estudantil achei que ia a passeata com amigos já que Eliseu tinha votado nele. Ocorre que meu amor, já arrependido, compareceu e ao meu lado com nossas caras pintadas, fomos gritar fora Collor. Depois de anos de ditadura foi libertador poder gritar bem alto sem ser preso que não queríamos um governo corrupto.

          Em plena esplanada dos ministérios eu e meu amor aproveitamos o momento e andamos o tempo inteiro de mãos dadas e de vez em quando nos olhávamos com a cumplicidade que apenas quem ama tem. Naquele tempo era o que podíamos fazer, mas minha felicidade era tão grande que aquelas horas ficaram guardadas na minha memória como um dos momentos mais sublimes da minha vida. Foi uma transgressão que ninguém sequer desconfiou e sempre foi um segredo nosso.

          Eliseu partiu de volta a pátria espiritual no final de 2002 depois de comemorar comigo a eleição de Lula. Hoje fico pensando o que ele acharia desse momento triste que o Brasil está vivendo. O povo brigando contra o próprio povo idolatrando duas pessoas que não estão nem aí para nós e só pensam no poder. Fico imaginando sua reação ao saber da roubalheira que o PT, partido que tanto lutamos para colocar no poder, praticou no nosso Brasil.

          Que saudades de você meu amor! Como gostaria de ter você agora ao meu lado para debatermos e ensinarmos a outras pessoas é possível amar e também respeitar a opinião do outro.

José Raimundo Marques
Enviado por José Raimundo Marques em 02/02/2022
Reeditado em 02/02/2022
Código do texto: T7443273
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