Carta Aberta

Você deve estar estranhando a minha demora em compartilhar alguns trechos da carta que me propus escrever para os meus compatriotas que se dispersaram pelas regiões da Judeia e Samaria, imediatamente após o apedrejamento de Estêvão que havia sido escolhido para integrar o primeiro grupo de discípulos, e cuja responsabilidade maior seria exercer, na prática, o cuidado social pelas viúvas e demais necessitados da igreja em Jerusalém.

Diante das enormes carências vividas pelos nossos irmãos na fé, Estêvão tornou-se um ícone do braço social da Igreja recém nascida, ilustrando desta forma que, a expressão da fé e do amor a Jesus não pode estar dissociada da prática das obras sociais destinadas ao amparo de pessoas carentes.

Estêvão morrera como mártir do Cristianismo recente, mas as perseguições haveriam de continuar por muito tempo, como a História registraria, pelo menos até o reconhecimento do Cristianismo como religião oficial do Império Romano em 384 a.D, após ser permitido pelo Imperador Constantino Magno em 313 a.D.

Muitos cristãos foram mortos, incendiados vivos ou atirados às feras no Coliseu Romano e a pergunta que precisava ser respondida era: "Vale a pena seguir a Cristo e ser perseguido por causa da fé?"

A resposta já havia sido dada por Jesus, mas, na prática, a perseguição e a provação produzem perseverança quando a fé é confirmada em meio às lutas. Ao ensinar as multidões, Jesus contou a parábola do semeador que, ao jogar as sementes ao solo, algumas delas caíram no meio dos espinhos. Essas germinaram, cresceram, mas em determinado momento se perderam porque ficaram sufocadas pela pressão dos espinhos que representam também as perseguições.

Noutras palavras, é em meio às lutas e aos sofrimentos que a Fé se mostra ainda mais presente e firme. Ou então, serão as dificuldades, as críticas, as perseguições, a discriminação social política e ideológica que irão provar se a decisão de seguir a Jesus é real ou trata-se apenas de cosmetologia cristianizada.

Por esta razão escrevi em minha carta: "Tornai-vos, pois, praticantes da palavra e não somente ouvintes, enganando-vos a vós mesmos."

Naqueles dias, em meio a disputas existentes entre lideranças dos hebreus e dos helenistas, ou as disputas teológicas sobre impor aos não-judeus a observação da Lei de Moisés, foi preciso reunir toda a liderança dos presbíteros, apóstolos e demais líderes para o que seria identificado como o primeiro Concílio Cristão ocorrido em Jerusalém.

Após longo debate, foi aprovada a proposta conciliadora que eu mesmo recomendei e que definia ser a salvação um bem distribuído a todas as raças, povos, etnias, línguas e nações mediante a fé única e exclusivamente depositada em Cristo Jesus reconhecido como o Filho de Deus e Messias de Israel.

Como a proposta deveria ser "conciliatória", construímos juntos a recomendação de que os não-judeus não precisariam se sujeitar aos rituais dos judeus, mas que deveriam se abster da idolatria que é a adoração do panteão de deuses dos gentios, bem como deveriam se abster da imoralidade lasciva identificada nas relações sexuais consideradas ilícitas, ou da prática de se alimentarem de carne sufocada e sangue.

A razão disso, e aqui incide a importância da conciliação, era que, em cada cidade e desde tempos muito remotos, estas recomendações da Lei Mosaica eram largamente ensinadas, difundidas e praticadas.

Aí está o segredo da perseverança na fé. O "respeito e a consideração respeitosa pelo outro!"

Se o Cristianismo não respeitar as práticas litúrgicas fundadas numa teologia diferente da que todos conhecemos no Ocidente, jamais poderá haver conciliação entre o Evangelho, evangelistas e evangelizados.

A grande verdade, enfim, para a realidade conhecida do colonialismo das Américas é que o Cristianismo que aqui chegou estava a serviço da política colonialista e patrimonialista dos subjugadores.

O valores culturais das nações indígenas das Américas com as suas práticas religiosas foram demonizadas pelos "cristãos", de sorte que tudo quanto não representasse os valores impostos pela Igreja Institucionalizada era produto de Satanás, O QUE NÃO É VERDADE!

Nessa corrida, o genocídio passou a ser praticado de forma criminosa a ponto de centenas de milhares de indígenas em toda a América ou, em todo o Novo Mundo terem sido dizimados.

Na América do Norte, os primeiros colonizadores mataram centenas de milhares de "bizões", um símbolo dos mamíferos da fauna norte-americana condenando os índios à fome, ao frio e ao abandono das suas terras que acabaram sendo ocupadas pelos colonizadores, enquanto os indígenas peregrinavam pelos territórios inóspitos para onde tinham se refugiado os "bizões" que significavam a sua sobrevivência.

Não posso concluir esse texto sem mencionar o que escrevi para alguns que se diziam cristãos, mas cujo procedimento era reprovável. Eu lhes disse:

"Tendes vivido regaladamente sobre a terra; tendes vivido nos prazeres; tendes engordado o vosso coração em dia de matança; tendes condenado e matado o justo sem que ele vos faça resistência.

Eis que o salário dos trabalhadores que ceifaram os vossos campos e que por vós foi retido com fraude está clamando; e os clamores dos trabalhadores penetraram até os ouvidos do Senhor dos Exércitos."

Concluo afirmando que "qualquer semelhança NÃO é mera coincidência" com o que se prática de maldade em nome de um falso Cristianismo.

Ser cristão, portanto, deve ser não apenas a simpatia ao que se produz de religiosidade para as massas!

Ser cristão é ter a capacidade de se insurgir contra a demonização de tudo, de se insurgir contra a corrupção endêmica de governos e de pessoas afetas a eles!

Ser cristão é doar-se ao outro como demonstração do amor altruísta, mesmo em meio à crítica e à discriminação dos seus pares.

Ser cristão é, simplesmente, seguir a Jesus na demonstração prática, palpável e evidente dos seus traços de caráter amoroso, misericordioso e compassivo.

Você é um cristão?

Deus te abençoe!

Pr. Oniel Prado

Verão de 2022

30/01/2022

Brasília, DF

Oniel Prado
Enviado por Oniel Prado em 01/02/2022
Código do texto: T7442322
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