Mexendo idéias
Mexendo idéias
O que mais me chamou a atenção no “The Billion Dollar Code”, seriado alemão de 2021, não foi a ação judicial contra a gigante Google mais a denúncia da pirataria da mesma, e sim o quanto a visão ainda longínqua dos inventores do Terra Vision, em 1994, uma quimera ainda não conceituada, da Web, da Nuvem da Web e sua consequente capacidade de armazenamento. Aquilo estava ligado ao invento, mas não existia. Curioso, isso. Para quem não sabe, descontadas as devidas proporções, Google Earth=Terra Vision.
Como sempre, cada época tem seu encanto, eis um chavão que continua pertinente.
Em 1961, no Reino Unido, a mando do governo uma viatura circulava pelos municípios a fim de aferir, através da tecnologia disponível, se você, no seu sobrado, estava assistindo televisão e mais, se havia pago o imposto para desfrutar de tal passatempo. Isso durou até o ano 2.000. Parece difícil de acreditar, mas “television licence” foi uma realidade para os habitantes do reino.
E nós achando que o manicômio foi inventado aqui.
Um show de TV, em 2022, pode ser considerado um sucesso se tiver audiência em torno de 10 milhões de espectadores. Quinze milhões e os caras acertaram na loteria. Ora, de 1951 a 1957 havia nos USA uma sitcon chamada “I Love Lucy”, audiência, 60 milhões.
Quem viu, sabe o valor.
Estamos num momento de ondas sobre ondas sobre ondas, o que já existiu antes - não existe mais - e no meio dos solavancos pode-se ao menos observar.
Nunca vi tantos se arvorando a ter todas as respostas. Certa feita soube de um marido que definia a esposa da seguinte forma: ela entende de tudo, desde parto de onças a atracação de navios. Agora, tente dizer isso em Klingon, sem olhar no dicionário.
Está me parecendo, veja bem, algo válido tanto para pessoas jurídicas como físicas, que muita gente agora pode ostentar o título de O Melhor Vendedor de Cavalos de 1902, digamos, em Detroit.
“Breaking Bad” é um seriado laureado lançado em 2008. Vamos examinar as premissas: O cara tem 50 anos em 2008, a mulher dele não parece boa bisca, o tempo vai dizer, o filho é aleijado, quando ele tinha 27 anos foi membro de um time de pesquisadores que ganhou o prêmio Nobel, e agora (2008), com 50, ele leciona num coleginho mequetrefe e completa a renda lavando carros, literalmente, mão na massa, balde e esponja. Tá difícil. Daí vem um diagnóstico hediondo, câncer no pulmão, 6 meses de vida. Metade do primeiro episódio. As premissas já induzem às ações futuras. Eu parei por aí. Além da temática não me animar, descobri que o segundo episódio, 60 minutos, é sobre a desova de um cadáver.
Colega, “Ozark”, seriado de 2018, tem uma agilidade narrativa tão feroz que, por comparação, “Breaking Bad” concorre ao título de O Melhor Vendedor de Cavalos de 1902.
Isso não passa de um micro raciocínio, sobre um micro exemplo.
Se quiser um bom macro exemplo, a mídia mainstream. Na atualidade, além do vírus, pouco sobrou para eles falarem. Previsão do tempo? Basta um clique no celular.
Ontem um amigo me enviou o link de “I RACE AGAINST 150 RIDERS GoPro POV - REDBULL CAMPO MADNESS”. Filmagem Câmera Subjetiva de 12 minutos de uma prova de BMX ou bicicross, como queiram, onde tive o cuidado de colocar uma trilha sonora adequada e na tela cheia do computador. Vinte e cinco minutos depois mandei para outro amigo, cineasta, com os dizeres: Sinto dizer, o cinema acabou, olha o Oscar 2023 aí...
Mais um micro raciocínio.
Dia desses, navegando, achei fragmento de um poeta cujo nome me fugiu, e ainda usei como comentário num texto. Mui apropriado. E serve também para fechar a crônica. Para um grande número de seres, a Terra está no inferno, basta ver as notícias, etc. Não deixa de ser uma maneira de ver a coisa.
Já para o tal poeta: “Talvez seja por isso que só existe um inferno - o de não abrir, o de não sair de si, o de não abrigar o outro”.
(Imagem: Berenice Abbott, Nova Iorque à noite, 1932)