HOMENAGEM A DOM MARCOS BARBOSA
BOAS LEMBRANÇAS DE DOM MARCOS BARBOSA
Nelson Marzullo Tangerini
Para o poeta francês Robert Mallet, “as boas ideias não têm idade; apenas têm futuro”.
Tal pensamento me veio à mente esta semana, quando encontrei, em meus arquivos – um monte de papéis velhos (anotações, poemas, crônicas inacabadas, pensamentos, cartas de velhos amigos e cartas enviadas a jornais), uma carta interessante, de teor pacifista, enviada ao suplemento Revista, do extinto jornal carioca Última Hora, de 23.7.1986. Sim, leitores, a Última Hora de Samuel Weiner:
“BRINQUEDOS VIOLENTOS
O presidente José Sarney, que quer desarmar o país, para acabar com a violência, devia proibir a fabricação de brinquedos que imitem armas.
Esse projeto, se não me engano, passou pelas mãos do ex-presidente Juscelino, e não chegou-se à conclusão alguma.
Se não é possível proibir a fabricação desses brinquedos, e hoje fabricam-se até mísseis, devemos conscientizar os pais a boicotarem as indústrias que se enveredam por esse caminho.
Assim sendo, como medo de abrirem falência, passariam a fabricar pianos, o que é muito mais saudável”.
Um amigo escritor, Clarindo dos Santos, autor de Rufião, me disse, certo dia, que eu era “um sobrevivente dos anos 1960”, anos em que as pessoas, conscientes do que acontecia no Brasil e no mundo, saíam às ruas empenhados em “lutar” (se esta é a palavra adequada) contra a ditadura assassina, a desumana corrida armamentista ou "lutar" a favor da defesa dos animais.
Sempre antenado em causas que julguei serem justas, fiquei algum tempo com uma mesa e uma cadeira na Cinelândia, Centro do Rio, para pegar assinaturas contra a matança de baleias. Uns riam; outros nos chamavam de comunistas (Há algo novo no front?).
Era presidente do Brasil o General João Figueiredo, e era muito natural que sentíssemos ainda o cheiro do enxofre, pois vivíamos cercados de figuras reacionárias e autoritárias.
Em dado momento, aproximou-se de nós o monge beneditino e padre Dom Marcos Barbosa, também escritor e Acadêmico, que fez questão de assinar nosso manifesto:
- Defender as baleias? É uma causa nobre! Eu assino!
Mais tarde, voltei a me encontrar com Dom Marcos, na Agência de Correios da Avenida 1º de Março, onde tínhamos caixa postal. Por ali, através de minha caixa, chegavam as missivas do poeta Carlos Drummond de Andrade, que viriam a ser publicadas em meu livro “O professor e o poeta”, publicado, em 2015, pela Editora Autografia.
Quanto à carta do jornal, quem a leu, na época, achou que o futuro escritor era um homem infantil, sonhador, com ideias de um rebelde adolescente sem causa, que, no futuro, desistiria de seus sonhos. Arroubos de juventude!, diziam.
“Os sonhos não envelhecem”, é certo; mais maduros, eles se tornam mais embasados, politicamente.
Aquele adolescente envelheceu, mas o seu sonho pacifista continua vivo, e incomodando as pessoas que embarcaram nessa onda armamentista vomitada a todo instante pelo mandatário deste país.
Nos anos 1970, não sei precisar em que ano, os imbecis chamaram John Lennon de “palhaço do ano”. Por ser contra a Guerra do Vietnã, por ir para as ruas com Yoko protestar contra a irracionalidade. Revolucionário e bombástico, o ex-Beatle respondeu que preferia ser chamado de palhaço do ano enquanto pessoas sérias estão matando seres humanos no Vietnã.
O palhaço é um artista que ilumina almas humanas com sua alegria e seu sorriso; os armamentistas, com suas mentes doentes e sombrias, além de viverem da venda de armas, para se tornarem ricos, milionários, pouco se importam se vidas humanas são deletadas como insetos, todos os dias, em todos as guerras estúpidas existentes neste belo Planeta transformado em manicômio.
O sonho não envelheceu. Este velho amante da liberdade continua o desarmamentista de sempre, porque a juventude sadia, libertária, é revolucionária, e ela continua acesa dentro de mim.
Lauro de Araújo Barbosa, pseudônimo cristão Dom Marcos Barbosa, OSB, nasceu em Cristina, MG, a 12 de setembro de 1915; faleceu no Rio de Janeiro, RJ, 5 de março de 1997.