Vamos fritar como bolinhos.... (ainda nas redundâncias)
Não vamos mudar. Talvez na escadaria da evolução haja uma pequena melhora nas nossas humanidades, mas somente para alguns, os das palavras mágicas. Ainda somos feras. Do mal. Evolução plena, total e irrestrita, só depois de umas quinhentas e cinquenta encarnações, fora isto, é umbral, sem chance... Precisei ir ao banco para uma simples operação, coisa que qualquer criança com menos de dez anos faria brincando, já me senti encalacrada. Deve ser toque, neura, devo ter caído de cabeça quando criança, pois é falar em ir ao banco e já fico mal. Tenho umas coisas estranhas, minhas inseguranças, acho que fiquei assim, porque sempre fizeram tudo para mim. Num ato de muita bravura até vou ao banco, mas me arrastando, pisando em ovos e xingando, mentalmente, todos os humanos. Tenho, também, uns lances sinistros com horários, chego cedo demais nos lugares. A mania infernal de chegar antes da hora em qualquer lugar me dá náuseas, mas não consigo mudar, Jung deve me entender, meu médico acha certa graça das minhas atrapalhações. Fico maluca e morro de raiva das pessoas que usam o caixa eletrônico rindo, conversando, chegam a ficar de costas para a máquina, se duvidar, tiram até selfies exibindo as sobrancelhas desgovernadas. Eu ali, parada, em choque, me puxando nas rezas para acertar uma mísera operação. Acho que comigo a questão é espiritual mesmo, me vejo entrando no banco com um espírito do australopithecus “garrado” no meu pé. Chego mais cedo na agência, me jogo para dentro do álcool, uso duas máscaras e mais um guardanapão embebido em álcool 95, vou cantando mentalmente o “Segura na mão de Deus”, é um clássico, meu hino favorito para ter coragem, raramente dá certo, tremo mais que vara verde. Basta uma simples olhada para a máquina cheia de teclas, que já começo a ter reações sinistras e esotéricas. Agora tive um pequeno insight, lembrei que nas missas do colégio tínhamos que cantar “Segura na mão de Deus”, nunca esqueci, mas nem sempre funciona, operações bancárias me travam, deve ser o macacão ancestral grudado no meu tamanco. De certa forma, na escola, este hino me assustava, eu sempre me imaginava encolhida num barquinho, num mar gigante e cheio de ondas e nada de aparecer a mão de Deus, acho que o meu barco sempre naufragava. O hino me traumatizou um pouco, preciso processar a Igreja, acho que os hinos do Padre Zezinho eram mais fortes, truculentos, espantavam qualquer “encosto” de insegurança. Mas eu falava da mania de chegar cedo aos lugares, pois hoje foi um destes dias insuportáveis. Me arrumei, o coração já estava em frangalhos, espatifado, mas fui com tudo, enfrentei. Já entrei no táxi meio atravessada, fiz o possível para ser cordial com o motorista, mas minha pressão já começava a “se aparecer”. Se tem uma coisa que me incomoda profundamente e que me deixa maluca é quando, no táxi, estou cantando a “bocca chiusa” o “Segura na mão de Deus” e o motorista fala alguma coisa. Putz, meu dia termina bem aí, me atrapalho toda no hino e tenho que recomeçar, isto me inferniza a vida toda. Pela mania de chegar mais cedo, assisti a chegada triunfal de todos os funcionários da agência, da gerência até a galera da limpeza, acho que não faltou um. Eu contava com a solidariedade daquela funcionária auxiliar que fica correndo enlouquecida entre os correntistas respondendo, aos gritos, o que a gente não entende. Pois a triste da guria não aparecia. Já se formava uma fila substancial e eu tendo náuseas, tonturas e algumas vertigens. Voltei a mexer na máquina para fazer o depósito e nada, tive a impressão que estava me dando crise de urticária e início de calorões, sempre tenho calorões quando fico tensa, meu mundo vai ruindo aos poucos. “Nêque” a estagiária passou por mim, rosnou qualquer coisa e me enfiou numa fila gigantesca. Todos reclamavam de alguma coisa, é o lado divertido da fila, vai do trágico ao cômico. Não converso com as pessoas, mas sempre dou um jeito de ficar escutando o que corre em volta. Tirando a desgraceira, há assuntos bem engraçados, mesmo por baixo das máscaras. Fui atendida depois de umas quinze pessoas. Dei meu risinho do Mutley (cachorro bem cretino aquele), quando o próprio funcionário se embananou com o meu depósito (era para um outro banco), lavei a alma e vi não ser a única taipa neste universo bancário e cheio de taxas. Minha saída da agência foi mais que triunfal, naquele momento percebi que, de maneira geral, vamos direto assar na lava fumegante do umbral, pouquíssimos serão “escolhidos”, foi ali que quase desisti de ser educada e cheia de passarinhos e borboletas sobre a minha cabeça. Fiz de propósito para ver se os nossos sentimentos melhoraram um pouco. Abri a porta da agência para sair quando vinha chegando uma senhora, fiz sinal para ela entrar, a animala passou direto, nem um “bom dia” eu ouvi, continuei com a porta aberta para um cretino de um homem entrar, o desalmado também passou reto, nem o “bom dia” nem o “obrigada”, ele podia ter rosnado qualquer coisa, podia, até, me mandar pastar, mas nem tchum para mim, e eu ali, parada, segurando a infame da porta, vontade absurda de meter a mão na fachada de alguém, deixei passar mais alguns animais, mas já eu estava rosnando. Quando me vejo em meio a estas grossuras, sinto que um diabão fica me cutucando e me mandando dar na cara da cretinada toda, acertar um coice, à gaúcha, nas bundas, putz, como tenho vontade. Passaram uns cinco trogloditas e nenhum agradeceu a minha boa vontade ou me dirigiu um simples bom dia (adoro estes testes ). Nunca mais abro portas para pessoas, vou voltar a ser primata. Mas valeu, cheguei à conclusão de que perdemos, irmãos...perdemos...