CADÊ A POESIA?
Penso que a poesia se desiludiu comigo, perdeu qualquer interesse em meus sentimentos e, sorrateira, saiu de minha vida como os pássaros fogem das gaiolas e dos predadores. Porque senti sua ausência na alma, seu esvanecer no coração, seu riso tornar-se mutismo e meu semblante petrificar. As flores, a brisa, o luar, o amor, a própria vida, em tudo onde outrora eu via poemas e rimas hoje avisto apenas saudade e sombras, acabrunhado, macambúzio. Parece-me, nesses dias, não divisar graça em nada, não mais descobrir a poesia sempre presente nas coisas mais simples dos dias passados. E um poeta sem poesias é estéril, oco, desprovido de propósito.
Divorciou-se de meu encanto a poesia? Terá encontrado outras paixões durante a caminhada de meus anos, algum poeta mais inspirado, mais arrebatado de amor, mais incontido nos arroubos poéticos? Foi-se de súbito ou aconteceu de forma paulatina? Sonho e anelo que ela tenha somente decidido tirar férias dos meus desencantos e esteja vagando por aí para espairecer, folgar um pouco de mim.
Destarte, por enquanto sigo tateando no apavorante escuro das palavras desencontradas, no apagão poético de que fui acometido, no vazio que me surpreendeu ao perceber ter sido abandonado pela incomparável e mais pura beleza capaz de tornar a vida mais linda e suportável: a poesia. Que ela volte logo e nunca mais desapareça dos meus olhos deslumbrados e nem se desmaterialize da magia dos meus dedos, que a escrevem impulsionados pela maravilhosa presença da musa sempre inspiradora. Que retorne logo, meu coração chora.