Contagem Regressiva - Uma breve saga de uma demissão incentivada pela busca da felicidade

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Decidi fazer um pequeno post por dia nesta que é minha última semana no terceiro emprego da minha vida. Como diz o título, é uma contagem regressiva.

Durou um pouco mais de 17 anos para eu ir embora.

Não há como se arrepender de nada até aqui.

Deste lugar tirei lições de vida importantes, principalmente logo que entrei, tão jovem, com apenas 25 anos.

Hoje, com 42, sinto que é o momento certo para partir rumo a um outro futuro, já que aqui, o futuro é um borrão numa folha em branco.

Nesta segunda-feira, rotinas e rotinas, como todas as outras incontáveis segundas-feiras em que aqui estive.

Será uma semana estranha, mas de grandes expectativas para o início de um necessário novo ciclo.

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Hoje vou fazer o exame demissional.

Após alguns dias de chuva constante, o sol voltou à carga em Itajaí. Portanto, vou à pé.

Engraçado que ainda me lembro do meu exame admissional aqui no Porto.

Entrei na sala e o médico, um ser decadente que claramente só estava ali pelo dinheiro, mal olhando na minha cara me perguntou como eu estava.

Eu disse que bem e melhor agora.

Atrás de uns óculos ensebados e de um bigode horrível, ele fez anotações, perguntou se sentia dores e tal. No alto dos meus 25 anos, não tinha nada.

“Certinho, Jefferson. Leve esse papel no RH e boa sorte. Quando sair, pode pedir para o próximo entrar”.

O que vou alegar se o médico do demissional me perguntar se sinto “alguma coisa”?

Aposto que ele não vai querer anotar tudo.

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Ontem, após o exame demissional, encontrei por pura coincidência com meu primeiro chefe no Porto. Ele aderiu ao primeiro plano de demissão incentivada que foi feito a um bom tempo atrás.

Ele me deu parabéns pela minha coragem. Conversamos sobre as perspectivas do Porto e sobre a vida que vem por aí. Foi uma conversa bacana e me recordei silenciosamente do primeiro encontro com ele, no auditório do Porto, no dia da nossa apresentação no primeiro dia de trabalho. Junto com ele estava outro Fiel de Armazém (o nome oficial dos chefes), que estava junto na ocasião.

Capacete de segurança branco na cabeça, colete reflexivo verde, de cara fechada, muito sério e enfático nas palavras. Basicamente ele discursou sobre o tamanho daquele lugar, sobre a responsabilidade do trabalho que iríamos desempenhar e sobre o amor que ele tinha pelo Porto desde que ele era varredor do pátio de cargas.

Acabei indo trabalhar na sala dele por uns meses e depois fui mudado para a sala do outro Fiel porque ele não tinha ido com a minha cara. Anos depois, nos entendemos e tudo está bem até hoje. Sempre que o encontro ele pergunta sobre mim, o trabalho e meu pai, com quem teve contato profissional dentro do Porto de Itajaí quando meu pai era agente marítimo.

Descobri mais tarde que meu cunhado também teve contato com o seu Cunha quando era motorista de caminhão e puxava container aqui dentro. Nas suas lembranças, ele tem a mesma impressão que eu: um cara sisudo e enérgico que não pagava imposto para brigar quando via algo errado.

E uma coisa é certa: o seu Cunha foi um grande professor para várias gerações de funcionários do Porto. Brigou por nós e pelo nosso setor inúmeras vezes e pelo Porto de Itajaí uma vida inteira.

Fiquei muito feliz com o incentivo que ele me deu ontem, pois “é preciso olhar para frente. O Porto como nós conhecemos nunca mais vai existir e tem que ter coragem pra encarar esse mundo aí…”

Ao final, nos cumprimentamos novamente e fui embora com mais algumas certezas na sacola.

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1...

Já arrumei algumas coisas por aqui.

Esvaziei gavetas e armários, separei meus equipamentos de proteção (ou os que eu achei por aqui), assim como meu crachá e documentos para entregar no RH amanhã.

Engraçado como o trabalho continua sendo desempenhado por mim da mesma forma mecânica e eficiente, como se para cada rotina, cada mensagem importante separada na sua subpasta correspondente para futuras consultas fosse realmente ser usada na semana que vem, no mês que vem, no ano que vem ou em algum futuro neste lugar que, para mim, não existe mais.

O trabalho, entretanto, existe, mesmo que um relaxamento acima do normal tente tomar conta de mim, assim como um sentimento cada vez mais presente de que minhas ações, neste momento, não deverão fazer grande diferença e que, inevitavelmente, outros farão com igual ou superior competência o que eu tenho feito há tanto tempo.

Dito isto, vem à minha mente uma frase proferida entre estas paredes desde sempre:

“Você vai e o Porto fica”.

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0!!

Chegou o dia!

Dei-me o trabalho de achar na internet um contador de dias e descobri que tive minha vida atrelada ao Porto de Itajaí por 6374 dias! É muito tempo!

Agora a ideia é olhar para frente, para uma nova forma de viver a vida e encarar os desafios que virão, quem sabe pensar mais simples, mais objetivamente sobre as coisas fundamentais que fazem alguém realmente feliz.

Além disso, tenho João Arthur e uma casa para cuidar, uma empresa para ajudar, uma família para apoiar para que todos possamos, juntos, estar tranquilos neste ano novo com tudo novo.

Vou procurar dentro de mim novas ideias e inspirações para voltar a trabalhar com prazer e alegria pois terei tempo e devo aproveita-lo bem.

E talvez esta seja a primeira grande obrigação e a mais desafiadora de todas:

Aproveitar o tempo que eu conquistei após 17 anos de trabalho ininterrupto no Porto de Itajaí para me encontrar novamente.

E isto é um privilégio enorme.

Publicado originalmente em https://ocronistainutil.wordpress.com

O Cronista Inútil
Enviado por O Cronista Inútil em 14/01/2022
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