EM BUSCA DE UM LUGAR TRANQUILO EM QUE EU POSSA ESQUECÊ-LÁ

Devo ser uma besta quadrada ou uma toupeira, ou talvez qualquer um desses maus adjetivos que as pessoas dizem. Saio só pelas ruas a divagar e poetar. Os motores e buzinas chacoteiam minhas condições, apenas o sol e o vento me respeitam. As pessoas continuam suas vidas, muitos nem percebem o papel em minhas mãos.

As sombras vêm e vão, já não ligo pra belezas e prazeres, só sigo e escrevo. Até aqui não tropecei (ainda), meu pisar é em falso, mas prudente. Meus ouvidos me situam, meus olhos só os desvio de vez em quando.

Tudo isso que escrevo é para parar de pensar nela, mas parece que as palavras que escrevo contêm as letras de seu nome. A angústia continua e eu caminho. Os ruídos me distraem e me desviam o raciocínio, o enjôo continua, sei que algo acontece, sou intuitivo e esse mau estar tem sua explicação.

Percebo-me como um louco, mas uma coisa eu sei: não gosto de sofrer (não mesmo), disse Vander Lee em uma de suas canções “românticos são loucos desvairados (...) que querem ser o outro”, isso já fazia eu antes com aquele musica de Caê, meu compositor preferido, “Sou mais eu porque sou você”, ah se na verdade eu fosse ela saberia me conformar e estaria sentado na sala de minha casa, quem sabe digerindo sem querer o “Domingão do Faustão” e não aqui sem rumo.

Há toda hora as únicas pessoas que reparo, e que por seguinte me reparam, são os vagabundos de rua, largados de mão pela sociedade, sem teto, sem lar. Fico a me pergunta: “será que não foi assim, como eu, que eles começaram?”

Mais uma vez o barulho me faz ter medo de continuar e o terreno começa a ficar perigoso, eu paro a escrita como se já soubesse volto a tê-la em meus pensamentos. Observo alguns crentes, um deles me oferece um jornal, aceito e decido assim que se achar um bom lugar, parar. Sem achar retomo a marcha.

No silêncio da rua volto a escrever, dessa vez olho tudo em volta, pareço acometido de vergonha, mas continuo. Alguns dizem ser o silêncio algo bom, quiçá divino, se assim for não o admiro, pois em silêncio pareço perceber a vigília de Deus e podem acreditar não tenho medo de mais nada nessa vida como tenho de Deus. E assim percebo que esse temor me ajuda a esquecê-la (apesar de relembrá-la não sofro por isso).

Mais uma vez desviei minha atenção, percebi uma floricultura com seus bibelôs e suas flores, nunca fui muito de gostar de flores, porém nunca as odiei tanto.

Ainda não encontrei um lugar tranqüilo, onde eu estou tem um movimento enorme, o que me faz perceber os homens, os seres ditos humanos, seus carros, suas cores, suas vitrines, seus sonhos e ambições. E como num lapso, relembro os vagabundos. O que eles devem pensar disso?

Meu peito doeu de verdade, tornando física a minha emoção, eu não queria mas voltei a pensar nela, sei bem que mesmo sem querer é dela a culpa de tudo o que sinto.

Apesar do movimento, nada de anormal, os bares e restaurantes estão vazios, os feirenses não gostam de sair aos domingos, pelo menos depois do almoço.

Observo nos outdoors o império do sensual, a agonia do ser humano em copular animalescamente, observo algumas mulheres em roupas excitantes, as quais os homens olham encegueirados.

Uma criança seguia com seu pai em uma bicicleta e se deteve a me olhar. Vi seus olhos, lembrei de mim criança ou sei lá, da criança que há em mim. Lembrei também de seu filho e da vontade de tê-lo como meu filho e assim mais uma voltam as suas lembranças.

Estou ficando cansado, a mão que sustenta o caderno que escrevo começou a doer, a que eu escrevo pede pra continuar, mas minhas pernas e minhas costas gritam: Pare!!! Eu paro de escrever, mas não de caminhar...

Mais uma vez eu paro e não acho um lugar tranqüilo pra ler o jornal, minhas costas doem muito e percebo então que também não achei um lugar tranqüilo para mim e daí decido voltar...

C.A.D S.T.C