Saudades

Não era nem 6h daquela manhã chuvosa quando ele beijou a sua esposa e desceu do carro com seu cachorro. Fazia muito tempo que em janeiro não chovia incessantemente estava cercado pela neblina e uma garoa típica da BR459. No KM 0 um antigo posto da Polícia Rodoviária Federal que agora abrigava um senhor simpático "conhecido como bigode" que tinha uns 14 cachorros ficava o " Pico do Ataque" um local muito frequentando na década de 80 pelos esportistas que saltavam de lá em suas Asas Delta que coloria o céu piquetense nos finais de semana um contraste com o atual cenário onde as pessoas iam apenas para ficarem sentadas lá observando a paisagem magnífica do lugar. Muitas destas pessoas na realidade até desconheciam dos muitos saltos e de pessoas que vinham de longe para sentir a adrenalina a aproximadamente quase 1300 metros de altitude. O fato de você estar lá encima da rampa sentindo a brisa no rosto durante o dia ou a noite para muitos já era o suficiente. A noite o que se via de lá era somente pontinhos luminosos na vastidão das cidades espalhadas no Vale do Paraíba. Quando ele desceu do carro um jovem com um gorro na cabeça e uma jaqueta com um emblema "TIND" veio ao seu encontro os cones cercavam a pista de uma ponta até na outra e vários cavaletes com placas sinalizavam " Trânsito Interditado ". O jovem disse: - Bom dia, o que o senhor deseja? Um sorriso de canto de boca e latidos espalhando pelo ambiente o homem apenas respondeu: - Preciso ver os meus pais na cidade de Piquete. Começou a trotar o cachorro na frente puxando a corrente o jovem gritou: - Passa! Passa! Alguns cachorros assustaram e brecaram, mais dois deles continuaram correndo e passaram pelos cones o homem olhou para trás e apenas ergueu o pau que estava na sua mão direita e os cachorros então voltaram ele viu o homem de jaqueta vindo atrás gritando: - Desculpe senhor, a via esta interditada! O homem apertou o passo o seu cachorro deu mais ritmo o jovem continuou correndo e gritando. Depois de três curvas olhou para trás e não viu mais ninguém. Começou a chover, ele passou pelo KM2 agora a neblina ficou mais densa e a chuva caia com mais intensidade. Ele continuou correndo, no KM3 encontrou com uma camionete da Defesa Civil o homem que estava dentro pareceu não acreditar vendo-o correndo com seu cachorro buzinou. Ele foi ganhando ritmo manteve os passos firmes o cachorro sacudindo o corpo jogando água para os lados firme no propósito já estava acostumado correr para todos os lugares com o seu dono era um poodle de pelos preto mestiço com vira-lata carinhoso e super companheiro. As pernas ainda estavam firmes quando passou pelo KM8 e nem ofegante estava. A saudade era o elixir que turbinava os seus passos. Um mês era muito principalmente quando os pais já tem idades avançadas. Cada dia que passa torna-se um tesouro perdido quando não se viam. As circunstâncias da vida proporciona os desencontros pois o trabalho, a família outras atividades intensas do dia-a-dia. E agora uma BR interditada, autoridades negociando entre autoridades é como se fosse uma tartaruga atravessando o deserto do Atacama. Ao passar pelo outro posto da P.R.F desativado lembrou de um treino ali a aproximadamente 20 anos atrás quando desceu pareando com outro colega suor escorrendo pelo rosto, parecia que o tempo não havia passado , ganhou mais ritmo. Os músculos das pernas contraindo a camisa encharcada a chuva diminuindo ao passar pelo paredão viu a sua cidade natal sentiu um arrepio no corpo foi desacelerando até trotar soltou o seu cachorro da corrente enquanto viu ele disparar na frente. Tudo contribuía ao seu favor, a pista molhada para não queimar as patinhas do " Fiel escudeiro", a BR praticamente deserta, a chuva para amenizar o cansaço. Quando passou pela torre que da acesso ao escadão faltavam apenas 2 quilômetros dos 12 quilômetros já percorridos. O telefone tocou, prontamente atendeu:- Alô. Do outro lado da linha uma voz meiga era a sua esposa querendo saber se estava tudo bem. Olhou no relógio marcava 7horas e 30 minutos, pensou na famosa " São Silvestre " que ele tinha tanta vontade de correr mais o preço era demasiadamente abusivo, tão abusivo que deu um sorriso de canto de boca e um suspiro e pensou na verba que já estavaa caminho para "consertar a BR459", viu alguns cones quando já se aproximava da pilastra era somente virar a direita e mais alguns metros estava na casa de seus pais. Muitas pessoas no local parecia uma "manifestação" e por sinal era mesmo e bem pacífica. Kombis cercando as pistas, caminhões e carretas, pessoas com faixas nas mãos tremulando pra todos os lados " POR FAVOR BOLSONARO PEDE PARA O ÉXERCITO CONSERTAR A BR459". O homem entrou no meio da multidão um repórter veio correndo na sua direção quase pisoteou o seu cachorro ele teve que segurar o cachorro no braço. O repórter perguntou:- Qual foi a sensação de cruzar a linha de chegada da BR 459? Olhou a sua volta várias pessoas com celulares nas mãos tirando fotos, filmando, já lançando nas redes sociais. HURRA! Ele estava ofegante apenas queria tomar as bênçãos dos seus pais e graças a Deus assim foi feito. Sua mãe foi que pulou no seu pescoço primeiro enchendo ele de beijos e seu pai em seguida com os olhos lacrimejando lembrou da jornada que fazia de Itajubá até Marmelópolis a pé, 15 horas caminhando. SAUDADES...

LUVI
Enviado por LUVI em 11/01/2022
Reeditado em 11/01/2022
Código do texto: T7427442
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