MATANDO A FOME !

 

Givanildo vulgo Chave de Cadeia, falou em alto e bom som para quem quisesse ouvir, lá no boteco do seu Gouveia, mais conhecido como Portuga, que aquilo era papo reto, papo de responsa!

 

E foi então que o Zezinho de Donana sujeito pacato e de boa, desatinou, chutou o pau da barraca e ficou virado feito onça. E como em todo boteco, lá também tinha a turma do “deixa disso!” e a turma do “cê vai deixar barato?, estava armado o sururu, e os dois desafetos foram às vias de fato e a pancada comeu solta, socos, chute no saco, e sopapos à dar com pau!.

 

Ninguém sabe quem chamou o camburão que chegou na surdina, sem sirene ligada, e levou o bar inteiro para o distrito. O Portuga jura que não foi ele!

 

Se tem coisa que vagal detesta, mesmo sem estar devendo nada, o que é muito difícil, é ter que dar explicações, ainda mais para a polícia. A maioria quer é distância!

 

Nessas ocasiões, o que parece impossível acontece, falador fica mudo de repente, valentão pipoca, amarela e baixa a bola, todos ficam acometidos de uma amnesia coletiva, ninguém viu, nem ouviu, nem sabe de nada!

 

Todos alegaram estar praticando uma atividade que requeria concentração, por isso não poderiam dar detalhes dos fatos.

 

Matosinho tentava encaçapar a bola sete, Duduca estava prestes a bater a partida de dominó, Jonas tinha ido ao banheiro, Catatau estava cortando o baralho, Portuga estava fritando pastel, Zóião estava contando as pedras do jogo, Laurindo estava secando a tacada do Matosinho.

 

Por isso ninguém havia se ligado no papo dos briguentos, só viram cadeira, copos e garrafas voando, o nariz do Givanildo jorrando feito um chafariz vermelho, o olho do Zezinho de Donana, roxo feito flor de ipê.

 

O estopim da encrenca era coisa lá deles dois, ninguém sabia de nada, na verdade nem sabiam a razão de terem ido parar lá no distrito.

 

Nem mesmo o Givanildo, nem o Zezinho de Donana souberam esclarecer o que havia acontecido. O delegado muito puto da vida, já que ninguém abria o bico, mandou todo mundo embora, não antes de um chá de cela de umas três horas e cacetada.

 

No dia seguinte o Portuga resmungava e anotava o valor do estrago, pois iria cobrar dos briguentos que não deram as caras no boteco, Duduca foi o primeiro a tocar no assunto:

- Uma coisa é certa, todo mundo sabe que a Valdete a mulher do Zezinho de Donana é mulher de fechar o comercio.

-E de arrasar quarteirão, completou Matosinho!

O Portuga, ainda fazendo as contas do estrago disse:

- Isso lá é verdade! No bom sentido, é claro!

- Mas será que aconteceu mesmo?: - perguntou Duduca.

– É muito vacilo, mas tudo pode acontecer, ir pro pagode com a Valdete a tiracolo é procurar encrenca na certa, disse o Zóião.

Laurindo virou a dose de cachaça e disse:

- Pior é encher a cara e esquecer da mulher. Foi levar bolo pra festa, teve gente que matou a fome!

 

 

 

 

 

AC de Paula
Enviado por AC de Paula em 10/01/2022
Reeditado em 10/01/2022
Código do texto: T7426404
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