PARÓDIAS DE LUIZ LEITÃO

PARÓDIAS DE LUIZ LEITÃO

Nelson Marzullo Tangerini

Continuando em nosso trabalho de resgate da História da Roda Literária do Café Paris, publicaremos, nesta crônica, dois sonetos do talentoso poeta satírico e teatrólogo niteroiense Luiz Leitão; em “Ouvir estrelas”, percebemos, de imediato, que Lili parodia Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac. E, depois, percebemos que, em “Visita à casa do sogra”, ele parodia Luiz Guimarães Jr.

Vejamos, primeiro, a paródia de Via Láctea:

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo,

Perdeste o juízo! Eu eu vos direi, senhores,

Que para ouvi-las, trago o bolso aberto

E às ‘facadas’ me exponho dos atores.

E as ouço, alegre, das ribaltas perto,

Enquanto a ‘turma’ dos conquistadores

‘Estrila’. E, finda a peça, ativo, esperto,

Inda as procuro pelos bastidores.

Direi agora: ‘Refinado trouxa,

Que conversas com elas tão brejeiro?

O que dizem na conversa rouxa’?

Eu vos direi: ‘Gastai para entende-las,

Pois só quem gasta o ‘burro’ do dinheiro

É que pode, de fato, ouvir estrelas’”.

E, agora, o belo e majestoso soneto de Bilac, considerado o “Príncipe dos poetas brasileiros”:

“Via Láctea (XIII)

Ora (direis!) ouvir estrelas! Certo

Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,

Que para ouvi-Ias, muita vez desperto

E abro as janelas, pálido de espanto…

E conversamos toda a noite, enquanto

A via láctea. como um pálio aberto,

Cintila. E ao vir do sol, saudoso e em pranto,

Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: ‘Tresloucado amigo!

Que conversas com elas?

Que sentido Tem o que dizem, quando estão contigo?’

E eu vos direi: ‘Amai para entendé-Ias!

Pois só quem ama pode ter ouvido

Capaz de ouvir e de entender estrelas’”.

Em “Visita à casa da sogra”, Leitão parodia o soneto “Visita à casa paterna”, parodiado, também, por seu amigo Nestor Tangerini, com já vimos na crônica “A casa do Sr. Elias”.

“Como urubu que regressa ao ninho,

A ver se ainda um bom caminho logra,

Eu quis rever também a minha sogra,

O meu primeiro e virginal carinho.

Entrei. Pé ante pé, devagarinho,

O fantasma, talvez, daquela cobra...

Tomou-me as mãos, olhou-me bem, de sobra...

E levou-me para dentro, de mansinho.

Era este o quarto, oh!, se me lembro, e quanto...

Em que, à luz da lua que brilhava,

O pau roncava forte, tanto e tanto,

No costado da gente, sem piedade...

Um cacete bem grosso lá no canto...

Minhas costas choraram de saudade...”

Leitão e Tangerini, como também já disse em crônicas anteriores, conheciam bem a tradição satírica em língua portuguesa. Para eles, navegar era preciso. Se o mar era português, como escreveu Pessoa, era justo se arriscarem nessas águas, correndo o risco de um provável naufrágio. Com “céu de almirante”, navegaram solenes nesses mares já navegados por poetas satíricos. Tanto isto é verdade, que Luiz Leitão foi apelidado de Bocage fluminense, logo após a publicação de seu 2º livro, de sonetos pornográficos, “Comidas bravas”, datilografado pelo poeta angrense Brasil dos Reis e prefaciado pelo seu grande amigo Nestor Tangerini. Infelizmente, não sobrou nenhum exemplar deste livro para fecharmos esta história.

Enfim, com seus sonetos hilariantes, carregados de uma sonoridade moderna, afinal os modernistas surgiam para demolir a escola clássica, mais precisamente os parnasianos, os dois poetas “parisienses”, ainda sob o efeito do Parnasianismo, registraram seus nomes na literatura satírica em língua portuguesa.

A poesia escrita pela 2ª geração do Parnasianismo, ou “Neoparnasianos”, termo criado pelo escritor e poeta Paulo Monteiro, não merecem sentir de perto o cheiro do ralo.

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 10/01/2022
Código do texto: T7426255
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