O PULSAR DA VIDA NO CREPÚSCULO

A tarde está nublada, deixando o céu acinzentado e as ruas toldadas, sem luz. O anoitecer logo ocorrerá, os pássaros já se agitam de umas árvores para outras, cantarolando melodias abafadas pelo barulho ensurdecedor dos carros. A vida pulsa, muitos andam apressados, alguns correm fazendo cooper, há os que apenas andam despreocupados; mulheres bem vestidas desfilam seu charme chamando a atenção não-só masculina, destacam-se também aquelas indiferentes à elegância que se apressam em busca de seus destinos. Lateja a vida, a rotina segue, o tempo se limita a intermitência, continuando o ciclo milenar e infinito. Tudo vai, voa, urge prosseguir, o ruge-ruge toma ares do ocaso.

Um velhinho sentado num banco da praça responde todo feliz e serelepe ao aceno ingênuo de uma garotinha carregada pela mãe, ela o encoraja no cumprimento, ele sorri trêmulo, explodindo alegria. Aquela inocente criancinha, sem saber, alegrara a tarde do idoso solitário, rebuscara nele, no alquebrado coração de tantos anos vividos, antigas lembranças de seus entes queridos adultizados, dos que cresceram e o esqueceram, daqueles a quem ele certamente dedicou os anos mais cheios de energia e viris de sua existência.

Um grupo de ciclistas esbaforidos, enfrentando o trânsito desenfreado, costurando ousados em meio aos carros, desviando de motos e desafiando a morte, desliza como se o amanhã não fosse chegar, como se o azul do céu não fosse escurecer, como se tudo e todos devessem sair do caminho para lhes dar a preferência, como se os pássaros ávidos por repouso não despertassem tão-logo os primeiros sinais da aurora, se houvesse realmente um novo nascer do sol após o último suspiro da noite, clareasse as plantas, o chão, os rios e os mares.

Subitamente a chuva desaba, as pessoas correm procurando abrigo, o ar se enche de um ranço abafado, sobe o mormaço do asfalto atravessando as máscaras no rosto de quantos ainda tentam se proteger da perigosa ameaça da pandemia do Corona Vírus. Embora passageiro, o chove-chove é molhadeiro e irritante, causa aborrecimento e desfaz as escovas de belos e longos cabelos femininos. Ouvem-se gritinhos e desabafos nervosos das mulheres flagradas pela chuva.

O crepúsculo é sempre um inesperado espetáculo.

Gilbamar de Oliveira Bezerra

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 03/01/2022
Código do texto: T7421216
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