NOMES...

Uma vez pedi a meu pai que me dissesse por- que me haviam posto o nome de Ruy.

- Seu avô, me disse ter sido amigo de Ruy Barbosa, na Bahia, bem antes de ele se tornar figura destacada da intelectualidade brasileira. Um dia cha- mou a mim e a meus outros irmãos e nos pediu que déssemos ao primeiro filho homem que qualquer de nós tivesse, o nome de Ruy. Dos irmãos, apenas eu tive filhos. Primeiro nasceu sua irmã e depois de três anos, você. Cumpri com a vontade de seu avô e por isso você tem esse nome. Por que a pergunta, filho?

- É que venho tendo problemas com esse nome tão pequeno, pai.

- Filho, seu nome é homenagem ao grande bra-sileiro que honrou nossa pátria, não apenas aqui, mas também no exterior. Ele discursava tão bem e era tão inteligente, que num Congresso, depois de discursar em várias línguas recebeu a denominação de Águia de Haia.

- O senhor já havia me contado isso, pai. Acontece que, hoje, quase ninguém mais fala em Ruy Barbosa.

- Então, qual é o seu problema com o nome?

- Outro dia, eu ia passando por uma rua e, um homem, que vinha atrás de mim, a poucos passos de distância, gritou. Virei-me, pois pensei que ele me conhecia e falava comigo, mas ele segurava um dos pés, já fora do chinelo e continuava a repetir: Ui! Ui! Só então entendi que berrava de dor por haver dado uma topada e estava com um dedo machucado. Ui é muito parecido com Ruy.

O pai sorriu e eu prossegui:

- Outra vez, dois amigos começaram a conversar na fila para comprar ingresso ao cinema e várias vezes pensei que diziam o meu nome, mas não. Eles cansaram de usar a palavra “fui” para caracterizar alguém indo embora. Guardei até uma das frases que um deles disse:

“- Aí eu me cansei da história que o meu vizinho me contava e me mandei, dizendo para ele: “Fui!”. E lá fiquei outra vez sem graça porque não era comigo que falavam. Nem sabiam o meu nome. Nem nos conhecíamos. Ui. Fui. Palavras curtas e que, pronunciadas rapidamente, confundem-se com o meu nome.

O pai sorriu novamente, colocou a mão, no meu ombro e disse:

- Sabe que você tem razão? Seu nome é o de um grande brasileiro. Pena que vem lhe trazendo aborrecimentos. Vou ver se a lei me permite mudá-lo. Tenho algumas sugestões. Que tal Asclepíades? Ou Tucídides? Ou ainda Eustáquio? Garanto que nenhuma exclamação de dor ou gíria da moda vai ser confundida com seu novo nome. O que acha das sugestões?

- Ah, pai. Tem tantos nomes maiores que o meu e que nem de longe se parecem com esses horrorosos que o senhor sugeriu...

- Posso listar outros, mas sei que no final você vai acabar mesmo é querendo voltar ao seu pequenino mas belo nome. Afinal não é tão comum alguém dar topadas perto de você ou usar a gíria que você citou. Como sabe, as gírias passam depressa.

- É, o senhor tem razão. Acho que estou levando um fato sem importância a sério demais. Vamos jogar uma partida de botão, pai? Estou indo preparar a mesa. Fui!

Ruy Soares
Enviado por Ruy Soares em 03/01/2022
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