CABEÇAS DE VENTO
Seria cômico imaginar Dom Quixote vestindo uma armadura, calçando suas botas e esporas, empunhando com força a sua lança e encarando um moinho de vento. E, diante dele, aquele coitado, girando o seu cata-vento suavemente, fazendo um barulho repetitivo e entediante do atrito com o eixo.
Ao apertar as esporas naquele pangaré e galopar diretamente para uma hélice, que estava girando, a cena adquiriu tons trágicos.
Não foi engraçado para Sancho, que tentou, gritando, o alertar. Atônito, Sancho assistiu o arremesso de Quixote e do cavalo para longe e para o chão.
Com todo o respeito, Sancho disse - Patrão, eu tentei te avisar que era somente um moinho de vento. Somente quem tem cabeça de vento pode ver um inimigo ali.
E não adiantou. Suas crenças eram mais importantes do que a realidade. É claro que ele estava vendo alguns moinhos de vento, mas ele precisava de inimigos naquele momento. Dom Quixote usou sua autoridade sobre Sancho para fazê-lo calar. Usou Deus para justificar sua luta contra o mal. Afinal, as pessoas do bem sempre podem contar com Deus.
Quando uma pessoa subestima o julgamento de Deus e se autoproclama “do bem”, está induzindo outras cabeças de vento a seguir o mesmo caminho.
Não foi engraçado ver pessoas acreditando na crise falada enquanto estavam vendo uma situação diferente. Não foi engraçado ver muitas pessoas defendendo o espião americano e debochando da vítima roubada. Não foi engraçado ver milhões de Quixotes acreditando numa fábula e desprezando a realidade. Não foi nada engraçado ver a mentira sendo usada com primazia sobre a verdade.
As pessoas com cérebro estavam gritando, mas as pessoas com cabeças de vento não queriam mudar de opinião. Para eles seria difícil imaginar que Deus estaria do lado errado. Para eles bastava acreditar que estavam com Deus numa batalha do bem conta o mal. Acreditar sempre foi mais fácil que pensar. Aliás, pensar foi sempre um trabalho difícil. Estes, como bois, seguiram com a manada.