Memória cheia de sentimentos antigos

As discussões constantes podem desgastar o sentimento, mas no meio das nossas conversas ácidas eu sempre me abrigava no teu olhar. As tuas palavras podiam até dizer para eu ir embora, a facilidade em ignorar residiam no castanho esverdeado dos teus olhos. Eu fui ficando. Eu ia somando a maciez das tuas mãos, ao gosta bom da tua boca, ao cheiro que exalava de vc inteiro sem mesmo precisar de perfume. Nas minhas palavras eu dizia q não era fácil te amar, parecia querer cultivar uma valorização para o fato de eu decidir todas as vezes por continuar o nós. Agora eu entrei num buraco cavado por dois, com espaço para um, apenas. Nem posso dizer que estou partida pq há tanto de vc em mim que entendo a inutilidade de tentar buscar o eu somente em mim pq não sei quais partes são vc na estrutura de ser eu. Não quero constatar que preciso levar vc comigo depois de ter dividido os móveis, o dinheiro, e ter deixado pra trás os gatos. Sim, eu não vou poder passar na rua distraída e ignorar os felinos. Eles vão comunicar p mim todas vezes essa sensação de doença, náusea, tontura, sensação de que o mundo inteiro lá fora é um grande aglomerado de gente tola. Isso, claro pq por tanto tempo eu e vc fomos sempre tão cheios de sentido. Eu e vc nunca precisamos de narrador para preencher espaços vazios, pq até nosso silêncio era bom de aproveitar. Era nesses silêncios que por tantas vezes eu busquei seus olhos, e a resposta do castanho-verde-mar me preenchia, enxendo meu corpo, como a energia galvanizada que deu vida ao Frankstein. De maneira similar ao processo literário, eu viveria por anos e não seria capaz de explicar como foi possível gerar vida àquele corpo inerte. Eu era um corpo inerte antes e agora volto para isso novamente. A energia vital abandona meu corpo. As suas músicas confundem meu gosto e eu só consigo pensar no verso que diz que 'se vc for embora eu vou virar mendigo, eu não sirvo pra nada'. Agora não tem nada de exagero nesse verso, ele nem msm parece metafórico. Ele está posto. Muitas outras coisas TB estão a contragosto do amor que sabemos dentro um pelo outro. O amor então não era a energia galvanizada que me deu vida, posto ele ainda estar aqui e eu ainda me sintir inerte, um corpo abandonado que se move agora por angústia e pavor de ter que encarar o mundo como outros tantos estúpidos solitários. Não percebo, mas todas as suas músicas tocam na minha playlist de memória, enquanto escuto contra vontade nossa trilha sonora, reverbera em mim um pensamento de não querer mais vc impregnando minhas lembranças, entrando nas memórias das minhas músicas preferidas. Eu reflito, como se buscando uma estratégia de me refazer e sofrer minhas dores sem lembrar de vc...mas aparece constantemente uma mensagem de alerta dizendo 'memória cheia'.

Suze Rodrigues
Enviado por Suze Rodrigues em 31/12/2021
Código do texto: T7418770
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2021. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.