LITERATURA "DESCARTÁVEL"

LITERATURA "DESCARTÁVEL"

Eu me espanto sempre com a quantidade de livros infantis jogados fora, obras caras, em papel-verniz, com desenhos belíssimos e textos nem tanto. Duvido que -- em nossa época de meninos (nos anos 50/60) -- alguém jogasse um Monteiro Lobato fora, as Aventuras de Tarzan na série "Terramarear" ou as fábulas de La Fontaine ou dos irmãos Grimm... agora, vai tudo pro lixo ! Anteontem, remexendo em maleta de roupas numa rua, lá estavam entre as peças vários livros, todos para o público juvenil, entre êles obra sem capa de Ganimedes José e duas brochuras caríssimas da logomarca "MINECRAFT". "Na falta do que fazer, faz-se besteira", diziam os antigos... não foi o meu caso, decidi ler as duas obras, livreto em papel-jornal meio amarelecido, sem capa, 114 páginas, além do luxuoso "Aventuras no Minecraft", quase um "capa-dura" com "orelhas" e em papel-couché suponho que de 150 gramas.

Quanta diferença em tamanhos iguais: no de Ganimedes são 42 linhas por página, letra pequena, sem título no cabeçalho, só 1 mm entre as linhas. No livro caro, cabeçalho em cada página mais 1 cm e 3mm de espaço para o início do texto e 2mm entre as linhas. Na página comparada, a 26, apenas 26 linhas, com o objetivo claro de tornar o livreto MAIOR e, portanto, encarecê-lo. Nas páginas que citam capítulos a linha inicial começa a 6 cm da borda superior, um "desperdício" malandro. Com relação ao conteúdo, há um abismo de qualidade (e criatividade) entre o livro pobre e a brochura rica. Ganimedes José aproveita seus conhecimentos sobre igrejas e museus de Ouro Preto e, com êles -- ou a partir deles -- tece uma bela história comparando amores do Passado na cidade trissecular com singelo romance juvenil na época da estória.

Quanto ao outro, meu sexto sentido me moveu a escolher o livro menor, "só 95 páginas"; seu "irmão golias" tem 240 páginas, os capítulos iniciam a espantosos 9 cm da borda (quase no meio da página) e, espertamente, suas linhas têm 1 cm a menos que no livro "concorrente". Explico a termo: no "livrão" da editora Record se lê descaradamente a expressão "uma aventura NÃO OFICIAL de Minecraft", além das "explicações" internas. No outro não há pudor... usa MINECRAFT na capa e, no interior, "informa" que o título original era "Terror na caça ao tesouro", volume 3, quem diria !

PIRATARIA MODERNA feita à luz do dia, AO VIVO e em cores... quem diria, repito, e a poderosa China -- que "copia" quase tudo -- sai lesada em seus direitos, supondo eu que sejam dela. Mesmo correndo risco de um processo, para PROVAR o que falo (e escrevo) eis o trecho inicial nos créditos do livreto ridículo, "ficção INFANTOJUVENIL americana", consta do texto: "Este livro não é autorizado nem patrocinado por... (e lá vem a relação dos reais proprietários) e por nenhuma outra pessoa ou entidade que seja dona", etc. (?!) Quanto CINISMO ! Tudo em vão, 2015/16 já vai longe e a mania extinguiu-se, até onde sei. Restou apenas essa "literatura" descartável, obra onde a heroína "morre" 30 vezes e ressuscita 31 -- uma pobreza absurda de imaginação -- onde personagens de pedra "almoçam" sopas e carnes (no capítulo final) e onde o leitor é feito DE BOBO o tempo todo !

"NATO" AZEVEDO (em 26/dez. 2021, 6hs)