MEDO QUE DÁ MEDO
Falar do medo dá medo.
Vasculhar certas fatias das nossas emoções
sem a devida autorização prévia exige coragem
e certa dose de loucura.
Afinal, vamos revirar escombros que mantém o sangue circulando
e ainda deixam escapulir suores pelos seus poros.
Muitos dos meus medos são notívagos,
dão as caras apenas nos sonhos. Ou melhor, nos pesadelos.
E fazem o diabo nessas encenações, por vezes bizarras e até cruéis.
O alívio que dá ao acordar daqueles infernos chega perto do gozo.
O tempo vai desarmando alguns medos que outrora
faziam o chão tremer e quase a casa cair.
E quando pensamos que nos livramos deles de vez, pasmem.
Lá virão outros medos, novinhos em folha,
prontos pra bagunçar o coreto de novo.
Daí constatamos quanto somos reféns deles
e da sua fértil imaginação pra comporem novos enredos
e roteiros, mesclando personagem que jugávamos
aposentados de vez, banidos de vez.
Acredito que meus medos vão perturbar
até o último suspiro, quem sabe até depois dele,
estreando também na próxima encarnação,
a ser parida com seu devido acervo medal
(acho que inventei nova palavra).
Poderia até sugerir um armistício,
negociando com eles (medos)
pra que abandonem o barco de vez
e irem azucrinar outra freguesia.
Mas penso que não darão ouvidos à minha proposta,
pois têm muito mais o que fazer, que doer,
que deixar a alma chorar.