O último jantar que vivi

Eu saí, saí da minha rotina, saí da minha casa, saí da minha vida um pouco. Essa saída foi para olhar pra minha vida de outra perspectiva, mas não foi o que aconteceu, não imediatamente, naquele momento eu só sofri. Sofri com a ausência, sofri com a solidão, sofri com o ser só em parte.

Ao trocar a minha foto de perfil eu entendi o lugar onde eu estou. Absolutamente desolado. Em meio a um deserto na cidade. De frente pra baía de guanabara, olhando pro Rio de Janeiro, eu vejo, em retrospectiva, que eu perdi o único lugar que me encontrava.

Essa posição me leva à última vez que não me senti assim. Um apartamento, com as tintas velhas e aos pedaços, não era um lugar bonito, mas a escuridão tapava as imperfeições do lugar.

Comprei a comida que você achava mais romântica, por alguma razão que eu nunca entendi. Levei um vinho porque você sempre gostava de beber comendo essa comida, achava romântico também. Escondi no meu bolso o anel. Pedi pra você esperar um pouco na cama enquanto eu ia fazer qualquer coisa fora do quarto. Acendi as velas, montei os pratos e entrei pelo quarto escuro à luz de velas enquanto você me olhava rindo.

Durante meses você havia me falado que ia me pedir em casamento se eu não pedisse logo e eu me esforcei ao máximo pra conseguir fazer algo que não levantasse suspeitas de quando seria, mas você já sabia que teria e eu sempre fui o pior pra te esconder qualquer coisa. Mas o momento havia chegado.

Me dirigi até você, pus os pratos na sua frente com as velas iluminando a gente e disse: "Eu sei que esse não é o melhor lugar do mundo, mas eu quero viver ao seu lado e construir com você o lugar onde nós queremos viver. Você quer se casar comigo?"

Com um sorriso no rosto ela disse sim e eu coloquei o anel em seu dedo. Nosso jantar se seguiu com algumas lágrimas. E essa lembrança apodrece rapidamente na minha mente, ela envelheceu como leite.