FALSA DEMOCRACIA
FALSA DEMOCRACIA
Nelson Marzullo Tangerini
Mexendo em papéis velhos e rascunhos amarelecidos, eis que encontro anotações minhas, escritas no final da década de 1980.
É antiga, portanto, a minha preocupação com o destino do ser humano no mundo:
“Segundo membros do PV (Partido Verde), houve um vazamento na Usina de Angra I, em 1986.
Em 1985, enterraram, na Baía de Piraquara de Fora uma cápsula de césio 137.
Segundo o Jornal do Brasil / Cidade, Rio de Janeiro, RJ, terça-feira, 12.12.88, pg. 1, ‘Além do césio 137, estão relacionados entre os materiais submersos o cobalto 57, o cobalto 60, o rádio 226 e o serídio 90’.
Que democracia é esta, que mantém esses acidentes em sigilo e que não dá, ao povo, o direito de opinar e dizer NÃO ao terror nuclear, através de um plebiscito?
Se o uso do átomo é para fins pacíficos, vide nova Constituição, não há como entender todo este sigilo. Estariam fabricando a bomba atômica? A TV Globo, através do programa Fantástico, domingo, 11.12.1988, veiculou a notícia de que o Brasil pode fabricar a bomba atômica em sigilo absoluto.
Não queremos bombas atômicas. Queremos o fim do desabrigo, da fome e do analfabetismo. Queremos verbas, sim, para a Ciência pacífica, para a Educação, para a Saúde e para a Cultura. Queremos, enfim, uma ciência comprometida com o pacifismo.
Quanto à cidade de Angra dos Reis, casos de câncer poderão surgir, num período de 100 anos.
Como ficarão a futura geração fluminense e todas os seres vivos, incluindo aí fauna e flora, que estão dentro do círculo da possível contaminação? As pessoas serão indenizadas?”
2021 chega ao fim. E descubro, na presente data, que minha preocupação com o meio-ambiente e os direitos humanos é uma luta antiga, luta que habita minha alma desde a adolescência. É como redescobrir-me e ter, hoje, na boca, uma frase que circula viva entre todos nós: “Eu avisei”.
A Angra dos Reis do romancista Raul Pompeia, autor de “O Ateneu” e do poeta Brasil dos Reis merecem um futuro melhor, com todas as modalidades da arte e do conhecimento.
Pôr lenha nessa fogueira, soaria como um desrespeito à natureza, e também poderia soar como uma apologia ardente às fogueira da inquisição. Precisamos reformular a língua, é certo, e expulsar dela todo e qualquer termo que sugira autoritarismo, racismo, machismo, homofobia ou fascismo.
Da década de 1980 para cá, muita coisa está mudando lentamente, a passo de cágado, ainda que o negacionistas e os fascistas se levantem de suas covas para nos amedrontar, defendendo a ausência de liberdade e o terraplanismo.
A língua, por exemplo, muda com o passar dos anos: expulsa dela termos preconceituosos. E ganha construções e palavras novas: neologismos. Nela, há uma necessidade intensa de oxigenação, de renascimento, de renovação. E isto acontece, também, com a ciência e a filosofia, porque tudo se transforma – ou deveria se transformar - para a melhor. As verdades eternas não existem.
A luta pela ecologia, pela liberdade, pela justiça e pelos direitos humanos é a vela que permanece acesa dentro da alma do escritor, de qualquer artista, do cientista - e da alma de muitos sonhadores e livres pensadores que continuam elaborando e construindo seus sonhos sob a luz das estrelas, da lua e do sol.
Liberdade sempre!