UM ESTRANHO NA MINHA CAMA
Vou dormir e me deparo com outro na minha cama. Dormia profundamente com leves roncos entremeando a respiração. A luz tênue vinda da rua permitia delinear nuances do seu corpo, já carcomido pelas famintas garras do tempo. Cabelos esbranquiçados e ralos em certas partes adornavam seu rosto de alma tranquila. Não pude ver seus olhos, mas os imagino atentos regados pelos galopes da experiência. Coração batia forte, determinado, altivo. Suas mãos carregavam uma pele que não economizava rugas, dando-lhe certo ar de sábio. Cobertores o protegiam do frio mas, mesmo assim, delineavam um contorno corporal sorvendo o sono merecido pelos tantos anos de escaladas, encontros e desencontros da vida. Fiquei alguns instantes contemplando aquela criatura, num misto de euforia e satisfação. Então decido não importuná-lo e sigo o meu caminho, deixando lá o pedaço de mim cumprindo seu descanso abençoado.