Capítulo III:
Passa o tempo. Alguns escassos pares de sapatos são entregues aos meninos para serem engraxados, luzidos. Esses foram alguns dos momentos felizes vivenciados pelos amigos!
No horizonte, o sol, em bocejos, já se punha por detrás das cacundas das serras – momentânea viagem para um breve descanso! Era a noite – mensageira de tantas fobias e decepções – se aproximando inexoravelmente. Dinheiro para o presente da mamãe? Não tinha! Ainda não havia conseguido o suficiente. O atribulado dia não deixava a maioria disposta na perda de tão precioso tempo engraxando velhos sapatos. Afinal, por que engraxá-los? À noite era o dia de estrear os novos, mais caros, sofisticados e mais bonitos calçados!
-Vou-me embora, Lu! Já está escurecendo e lá em casa não tem querosene para a lamparina. A mamãe tem muito medo de ficar sozinha na escuridão. Em seguida, apanhou a sacola onde continha alguns restos de comida – sua Ceia de Natal – conseguidos durante o dia, e se foi. Luizinho ficou na cidade. Na cabeça do Carlinhos havia a tênue esperança de, ainda, conseguir mais alguma coisa a qual pudesse levar para casa – um provável presente para a Mamãe!
Carlinhos se despede do amigo. Com a sacola às costas tomou o caminho de volta à sua casa. Na sua cabecinha a fixa ideia do presente para sua mamãe não havia morrido. Apesar de moribunda, a esperança teimava em tentar, por todas as formas, manter-se viva. Ela é – e sempre será – a última a morrer.
Segue o menino o seu caminho. Passando em frente a um florido jardim de uma bela mansão, ele vê uma linda e maravilhosa rosa vermelha. Suas púrpuras pétalas – molhadas pelo regador do jardim – brilhavam ao refletirem as luzes oriundas das luminárias natalinas. Seus argutos ocelos vasculharam por todos os lados. Não podia ser notado. Certificando-se que não fora visto, bem ligeiro, saltou o muro, colheu a belíssima rosa vermelha e saiu em desabalada carreira. Ofegante, somente parou para respirar – tomar um fôlego – depois de constatar não ter sido visto nem seguido por ninguém. Olhou para a bela rosa em suas mãos e essa pareceu dar-lhe um concupiscente sorriso. Menino e rosa riram. Rosa e menino ressorriram. A rosa vermelha sorriu por sentir-se realizada na sua inconteste missão de alegrar corações. E ela se sentiu feliz por ter sido colhida pelo menino e escolhida pelo Deus Criador, para alegrar tão nobre e meigo coraçãozinho de uma doce e inocente criança.
O presente da mamãe está aqui – pensou! Seria, aquele, o primeiro presente dado a sua tão amada mamãe. O primeiro presente de Natal! De novo, o menino – mesmo tendo a barriga vazia, mas tendo o coração cheio da imortal esperança – sorriu!