O imortal forró

 

          1. Nos velhos tempos, nunca fui muito de dançar forró.

          Gostava de dançar boleros.

          Era mais aconchegante, respondendo bem ao meu estilo.

          Mas, desde sempre, aplaudo, com as mãos e o coração, quem, até no chão duro dos terreiros do sertão, se esbalda ao som de um bom "pé-de-serra". Nascido no interior do Ceará, conheço demais a emoção que o forró provoca na gente.

          2. Como faz gosto ver uma matutinha, cá do Nordeste, grudada no pescoço do seu amor, naquele requebrado sensualmente impecável, dançando um forró verdadeiramente nordestino. Como faz gosto ver um matutinho, de sandália de vaqueiro, segurando a menina pela cintura forrozeando, até o sol raiar, ao som das sanfonas de forrozeiros natos, muitos deles talentosos, porém anônimos. Nem ela e nem ele frequentaram academias de danças. Nasceram sabendo dançar forró.

          3. Aproveito e aqui homenageio os forrozeiros do Brasil. E o faço lembrando Luiz Gonzaga, nascido em Pernambuco, no dia 13 de dezembro de 1912. Se vivo estivesse, estaria, amanhã, apagando suas velinhas.

          Gonzaga morreu no dia 2 de agosto de 1989, no Recife. Detalhe: O Rei do baião morreu cego, apesar de ter nascido no dia em que a Igreja festeja a santa protetora dos olhos, Santa Luzia. Coisas deste contraditório mundo.

          4. Ainda se pergunta, qual a origem da palavra forró. Consultei "A vida íntima das palavras", livro do belo escritor Deonísio da Silva, e fico com a opinião dele. Diz Deonísio que o forró tem uma "Origem controvérsa".  E prossegue: "foi tido como decorrente da festa "for all" (para todos); como uma corruptela da palavra forrobodó. E conclue Deonísio afirmando que há indícios "de que a festa e o vocábulo" tenham vindo da África". Fico, repito, com a conclusão de Deonísio que é nenhuma, apenas discorre sobre as hipóteses correntes. 

     5. Foi no Iguatu, importante cidade do sertão alencarino, que conheci o forró. Até onde minha memória ainda alcança, esse forró começava no sábado ao meio-dia e terminava na madrugada do domingo.

          Seu criador foi um militar reformado da Polícia Militar do Ceará, um cidadão querido e respeitado na cidade, segundo meu pai, que se dava bem com ele. Seu nome era Sargento Gouveia. Detalhe: este senhor, responsavel por momentos de alegria no Iguatu, minha cidade, era pai do compositor e cantor, maravilhoso, Evaldo Gouveia, que a covid-19 levou, no dia 29 de maio de 2020. 

     6. Muito bem. O forró acaba de ser declarado patrimônio imaterial brasileiro, por decisão unânime do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural do Iphan. Fundamentou o Conselho, considerando que o forró reúne "ritmos nordestinos, entre eles, o xote, xaxado, baião, chamego, a quadrilha, o arrasta-pé e o pé-de-serra". Bravo! Mas descobriram isso somente agora? Dança-se forró neste país, desde o final do século 19, em Pernambuco. A propósito, dizem os estudiosos, que há três tipos de forró: o forró pé-de-serra, o forró universitário e forró eletrônico. 

          7. Me desculpem. Sou mesmo ignorante, mas forró só existe um, o forró pé-de- serra. Aquele das noites de São João e o forró tocado nas festas do Sargento Gouveia, lá no Iguatu. Sobre a declaração do Iphan diria, repetindo, talvez, que ela chegou atrasada. Mas, como diz o povo, "antes tarde do que nunca". Pelo amor de Deus não me arrangem apelidos para o forró. Deixem-no como o sertão criou.

            

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 12/12/2021
Reeditado em 12/12/2021
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