HEMORRAGIAS TARDIAS
Escrevo pra não morrer de vazio, de medo, de solidão,
de frio, de o que for,
palavras são tecos de mim que chuto pro mundo,
que desnudo descaradamente.
Escrevo pra virar minhas entranhas do avesso,
pra descobrir novos recantos, novas nascentes,
novos planetas jogados num canto qualquer.
Escrevo pra chutar longe meus credores rabugentos,
abrindo cada comporta, cada tampa da alma,
cada flanco moleque e arruaceiro.
Escrevo pra escancarar minhas hemorragias tardias,
pra dissipar algozes, capengas desejos, soturnos chãos,
frugais pensamentos que teimam em ser paridos,
ou, quem sabe, banidos.
Escrevo pra desanuviar o escasso, o esquisito, o necessário,
assim me apresento a mim mesmo sem cerimônia,
sem rebarbas, sem passos de festim.