A corrente!
A corrente!
Lá em casa, na fazenda de minhas filhas, herança de seus avós maternos, tem fama de ser assombrada. Nada muito assustador, nem tão extravagante. Tem uma morada, que a não ser o Cuia, nenhum outro morador conseguiu ficar por mais de uma semana. Eles não sabiam explicar, só não ficavam!
Eu, quando lá morei, minhas filhas, as herdeiras, pequeninas, muitas vezes, no meio da noite, saí para atender um chamado, chegando lá nada.
Hoje, durmo lá sozinho e, ora ou outra, ouço chamar João, João, João... Já acostumei. As vezes, distraidamente respondo, quase sempre deixo para lá. Esconjuro, viro para o canto e volto a dormir.
Deve ser por causa disso que me interessei pela corrente, não uma corrente, mas um pedaço. Nove elos. Nove elos que pendurei ali, como encantamento. A Emerenciana me pergunta porque e eu bestamente não sei responder.
Tudo começou, não vou persistir que seja a nove meses, pastoreando próximo à tapera tropiquei, quase cai, e ao restabelecer o equilíbrio percebi a razão do tropeço, uma corrente enterrada no chão.
Praguejei. Ri sozinho. Segui o costume e inclinei para puxar a corrente. Ao tocá-la senti um choque, larguei incontinente e cai para trás. Espraguejei. Olhei para um lado, para outro, nada, só a Gaivota, a Beija Flor, a Maravilha remoendo. Tomei coragem e voltei a tocar aqueles elos sob a terra, fiz força e eles saíram suavemente, quase como se desejassem, os nove elos.
O que intriga, ali, onde tropiquei, passo há tantos anos, nada, nunca, mas de repente esbarro com nove elos de uma corrente, corrente que une, corrente que liga bem e mal, corrente que transcende o natural!
É só um pedaço. Pendurado na minha frente. Nove elos. Nove elos de correntes abandonados no meu caminho, na fazenda herança dos avós maternos de minhas filhas, com fama de assombrada, quiçá representando a eterna indagação do sentido da vida aqui e além!
Esconjuro, viro para o canto e volto a dormir!