Precisamos pensar no Progresso

O que eu queria, eu não pude ter. Porque, se eu o tivesse, eu não o quereria. É assim este querer: um querer não querer. Incompletude completa: é este o meu normal.

— Ô garçom, tem Brahma litrão aí?

— Não

— Tem Soda limão?

— Não

— Tem picolé Caicó?

— Tem. Vai querer?

— Não

Faz três séculos que não durmo direito. Este é o meu normal. Desconheço, portanto, isso de a gente morrer todo dia, apesar de eu ser meio íntimo do meio-fio que separa o solstício da segunda-feira das tempestades da sexta. Ah sextas-feiras, nebulosas e eternas sextas-feiras, vocês precisam ser transparentes. Permitam-me querer sem, contudo, ter. Ah sextas-feiras noturnas, suspendam-me o álcool etílico e o à base de cafeína; sustem o barulho sepulcral de meus bocejos; adormeçam o notívago que vaga em mim; apaguem todas as luzes ao redor de mim, num raio mínimo de dez mil metros.

Não se preocupem com o aumento no preço da Brahma litrão. R$ 6,00 não está caro não. Caro está melancia, cuja banda custa mais que duas Brahmas litrão. Não pensem que estou insinuando uma troca. Longe de mim tanto otimismo e perto estejamos do Progresso.

Precisamos pensar no Progresso. Diplomar-se, cadastrar chave PIX, compreender o Positivismo, defender a Itaipu Binacional...

— E depois? Poderemos dormir direito? Tomar honestamente nossa cerveja? Suspender nossos bocejos? ...

— ... Ô garçom, tem chá de camomila aí?

Damião Caetano da Silva
Enviado por Damião Caetano da Silva em 03/12/2021
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