CORPO DO ICEBERG

Tem dias que eu desisto de sonhar, só para não desistir do sonho. A vida é uma sucessão de falhas e desencontros e até os mais fortes cansam de tudo: do conhecimento, da consciência e da vontade de postergar ambos- conhecimento e consciência.

Estou farta dessas pseudociências ganhando força massiva, ludibriando quem precisa, ludibriando quem é privado de uma visão mais racional... Ludibriando quem também se priva de tal visão.

Estou farta do conceito de "good vibes", da mediocridade sendo romantizada, da política ter virado um espaço de guerra infantil e cada vez mais alienada.

Estou farta de entrar num espaço jovem e me sentir tão mais velha que todos eles. Tão mais chata. Tão desesperada. Tão ignorante. Eu não quero e não vou ser como eles, mas não é possível que somente uma pessoa tenha nascido ao contrário e todas as outras sejam tão normais em seus espaços e em seus círculos sociais.

Estou farta de tentar tanto e tanta coisa e não conseguir nada ou, quando muito, a metade daquilo. É natural conseguir menos do que mais, mas, o menos parece estar sempre ali, à espreita, e quando apareço, ele é empurrado pelo mais.

Eu estou farta e insatisfeita. Nem triste, nem brava, apenas sóbria demais para ser uma ébria social. Pode ser que ébria demais para enxergar o lado bom. Eu não sei, se soubesse não estaria farta, estaria dando um jeito. Sempre dando um jeito e escrevendo para não definhar.