Um Certo Cidadão!
Naquele dia eu pensei que seria o fim da nossa companhia de pesca, se é que eu posso identificar assim a nossa atividade laboral na Galileia.
De uma só vez, perdi três dos meus melhores homens, sendo que dois deles eram os meus próprios filhos,Tiago e João. Na companhia de Pedro, um líder à frente dos demais pescadores, os três decidiram abandonar as redes para seguirem um tal Jesus que aparecera, nem mesmo sei de onde, comissionando pessoas com um convite muito interessante, dizendo-lhes: "Vinde após mim e eu vos farei pescadores de homens!"
Procurei me informar acerca daquele galileu de Nazaré, e fiquei surpreso com o que as pessoas diziam dele. Primeiro, ouvi um dos seus seguidores que até poucos dias se dizia discípulo de João Batista. Era André, o irmão de Simão Pedro que, inclusive, foi recebido por Jesus em sua própria residência e que saiu de lá para, em seguida, influenciar o seu irmão. Este, ao primeiro contato direto com Jesus resolveu deixar a pesca para seguir o Mestre levando em sua companhia os meus dois filhos.
Claro que fiquei preocupado com esta decisão dos meus filhos. Afinal, naqueles dias de ocupação do Império Romano por toda a Palestina, andar em grupos poderia ser sinônimo de rebelião contra o Império e os soldados, a mando do Imperador eram extremamente violentos e cruéis para com os rebeldes que fossem apreendidos.
Por causa da minha atividade empresarial eu mantinha um bom relacionamento com os líderes religiosos da nossa nação, pois, afinal, eu abastecia a despensa das suas casas e das suas famílias com o produto da nossa atividade comercial, além de ser um conhecido contribuinte regular de impostos.
Aproveitando-me deste networking fui a eles para também ouvi-los acerca de Jesus de Nazaré. Aparentemente, ao menos até aquele momento inicial do trabalho de Jesus, os líderes judeus não estavam preocupados com a movimentação dele diante das multidões. Segundo entendi, para eles o Galileu era apenas mais um descontente com a ocupação Romana e com a assimilação dos judeus aos costumes e ordens emanadas de Roma.
Mas, os dias e os meses foram passando e, logo, os líderes perceberam que a sua autoridade já estava sendo questionada pelo povo comum, e a sua liderança já não era mais a mesma coisa. Passaram, então, a perseguir Jesus buscando, de alguma maneira, incriminá-lo como malfeitor diante das autoridades romanas.
Esta oposição dos sacerdotes, fariseus e escribas, e o comprometimento sério e responsável dos meus filhos em relação aos ensinos de Jesus, fizeram-me avaliar o meu próprio coração acerca de algumas declarações feitas pelo Mestre. Uma delas chamou a minha atenção, e aconteceu numa oportunidade em que Jesus foi duramente confrontado pelos escribas e fariseus acerca da sua missão, ao que o Mestre lhes respondeu:
"Examinais as Escrituras porque julgais ter nelas a vida eterna, e são elas mesmas que testificam de mim. Contudo, não quereis vir a mim para terdes vida."
Deixe-me dizer-lhes. Não foram os milagres feitos por Jesus que me levaram a um comprometimento com Ele.
De igual forma, não foi o interesse oportunista de ser ainda mais bem sucedido no meu empreendimento, buscando receber dele uma bênção especial de maior prosperidade.
Também não foram os meus filhos que me convenceram a segui-lo e aos seus ensinamentos. Eu não abandonei a nossa Companhia de Pesca, pelo contrário, passei a me utilizar dela para apoiar o ministério daquele que encarnava, literalmente, tudo o que as Escrituras ensinavam sobre o Messias Prometido.
Por esta razão, já passados três anos desde que o Mestre iniciara o seu ministério pela Palestina, eu não pensei duas vezes quando um dos meus criados chegou em minha casa na companhia do meu filho João e também de Pedro, meu antigo colaborador solicitando o cenáculo da minha casa para celebrar a Páscoa junto com os demais discípulos.
A minha casa era grande o suficiente para abrigar a todos e o cenáculo era um cômodo bastante acolhedor para recebê-los, portanto, autorizei a sua utilização. Mal sabia eu que aquela seria a última vez que Ele se reuniria com os discípulos para celebrar a Páscoa.
E foi exatamente isso que aconteceu. Saindo dali, dirigiram-se ao Jardim das Oliveiras e, ali mesmo, Jesus foi preso e conduzido ao Sinédrio, a Herodes, a Pilatos e, por fim, ao Calvário onde foi cruelmente crucificado.
Meu filho João, por ser amigo de Anás, o sumo sacerdote e também de Caifás, o sumo sacerdote em exercício naquele ano, acompanhou tudo de perto.
Dias difíceis!
Dias de profunda reflexão!
Dias de decisões importantes para serem tomadas em nível pessoal e também profissional.
Não me arrependo de ter ido a Jesus. Nunca abdiquei da minha liberdade de opinião sobre Jesus, mesmo diante das incertezas e das perseguições que se abateram sobre os seus discípulos.
Não deixei de ser empresário.
Não deixei de ser um cidadão no meu país.
Não me afastei dos meus antigos amigos e colaboradores.
Ainda hoje, me lembro do que ele disse aos escribas e fariseus, e que foi determinante na minha decisão de segui-lo como discípulo seu, ainda que à distância.
Esta palavra ainda ressoa forte em meus ouvidos e no meu coração:
"Contudo não quereis vir a mim para terdes vida!"
Eu fico me perguntando se você que está lendo estas memórias, não vive o mesmo dilema daqueles homens?
Por que não ir a Jesus?
Por que não reconhecê-lo como o Filho de Deus?
Por que não receber d'Ele a certeza da vida eterna?
Deus te abençoe!
Pr. Oniel Prado
Primavera de 2021
21/11/2021
Brasília, DF