Encontro, em sonhos, com meus personagens favoritos
Esses sonhos me causaram uma confusão na minha cabeça. Um emaranhado, uma profusão de pensamentos e sonhos acerca da literatura com meus personagens favoritos. São tantos! Isso me fez entrelaçar obras e autores num estilo prosaico, relatando meu encontro com eles, em sonhos, mas pareciam tão reais! Desde mocinhos e vilões, os mais bonzinhos e cativantes até os mais irritados, agressivos e mal humorados. Seria isso comum ou normal para um leitor voraz como eu?
Então pra começo de conversa digo que tive outro dia um sonho “gostoso” ao devorar o Misto Quente do Bukowski, (Que delícia!). Então, foi assim que me encontrei casualmente com Henry chinaski, ele ainda era pequeno e estava “escondido” embaixo da mesa. Quando cresceu conheci-o mais um pouco e confesso: Nunca vi um sujeito tão mal humorado. Não trocamos uma só palavra.
Em seguida peguei o caderno rosa de Lori Lamby e me deleitei com as peripécias da menina. Que menina travessa! Mais tarde fui atrás de O apanhador no campo de centeio mas ele não estava lá. Tencionava conhecer Holden Caulfield para saber mais sobre os dramas e desventuras da juventude rebelde.
E eis que chegou Lolita, bela e glamourosa, e com ela o amor, o amor nos tempos do cólera. De repente encontro o Shmuel, ele mesmo, o menino do pijama listrado conversando com Bruno, tristemente, ao lado de uma cerca eletrificada. Em tempos de guerra, sua inocência foi colocada diante de um monstro terrível e inimaginável. Foi um sonho tão triste! Vi também Liesel Meminger, a menina que roubava livros, achei-a muito simpática mas de uma morbidez terrível. Confesso que a minha paixão será sempre Capitu. Aquela mesma, do olhar oblíquo e dissimulado. Será sempre a minha paixão. Que sonho lindo! Ainda que eu viva cem anos de solidão... Assisti a morte terrível de Baleia. Que cena! Vidas secas, amargas, ainda que a vida segue com seus percalços, diante da seca secular do nosso nordeste.
Esse foi quase um pesadelo: Vi Gregor transformado naquele inseto monstruoso. Senti náuseas ao revê-lo como se tivesse acabado de ler o livro naquele momento. Apanhei algumas flores nos jardins de August Comte após um dia entediado ouvindo o cavalo de um forasteiro relinchar, mas era apenas um cavalo relinchando. Porque na verdade eu queria saber o Nome da Rosa. À noite tentando dormir ouvi de novo o relinchar, então foi tenebroso.
Resolvi confrontar a conflitante similaridade entre Sérgio (O ateneu) e Sinclair (Demian). Ambos tiveram amargas experiências em sistemas educacionais, que, se por um lado serviu de suporte na formação dos adolescentes, acabaram imprimindo em suas almas feridas atrozes, percursos que desencadearam os ajustes de suas personalidades e de haver contribuído para o autoconhecimento e evolução espiritual. Lembro também que estive com Sofia, a judia, e presenciei a sua dolorosa escolha. Penalizado, chorei ao vê-la angustiada e aflita.
Certo dia eu subi até o campanário da Catedral de Notre Dame e vocês já podem imaginar quem eu conheci de perto. Evidentemente não foi o cavaleiro da triste figura, de Cervantes. Embora o corcunda possa também ser estigmatizado desta forma por sua figura feia e degradante.
Mas é claro que me refiro a Quasímodo, o corcunda. Delicado como uma flor, apesar de sua aparência ridícula. A beleza está por dentro, certifiquei-me disso naquele momento. Conheci Alice, aquela do país das maravilhas, mas quando perseguia um coelho e acabou caindo em um buraco, tudo se transformou, às mil maravilhas, um mundo surpreendente, assombroso e extraordinário.
Adivinhem quem eu encontrei lá pelos sertões da Bahia? Isso mesmo, Diadorim entre os jagunços, travestida numa verdadeira armadura viril, seduzindo Riobaldo, encantadoramente.
Nessas idas e vindas, entrei na máquina do tempo e caí em plena Revolução Francesa, entre as mazelas daquele tempo um fato me deixou perplexo. Vi um homem roubando um pão para alimentar a irmã mais nova. Acabou sendo preso. Trata-se de Jean Valjean. Mais tarde quando foi solto e tentava refazer sua vida foi perseguido implacavelmente por um inspetor de polícia. Vi nesse cenário todos os miseráveis e a situação de desamparo que viviam os mais pobres.
Certo dia, encontrei com Cajango lá pelos rincões do sul da Bahia, entre as plantações de cacau. Assustado com sua figura feroz e animalesca preferi me esconder. Tudo bem, consegui vê-lo sem que ele me visse. Mas o que me deixou frustrado foi não ter visto a velha bruxa (Hebe), a centenária, com seus cabelos de algodão. Daria tudo para vê-la, correndo enlouquecida e aterrorizada com toda aquela tragédia e gritando: Mataram os passarinhos de Deus.
Um sonho meio que perturbador. Mas não deixa de ser um encontro. Foi casual, e não durou mais que 5 minutos. Sim, sonhei com Hamlet (de Shakespeare). Um cara cheio de conflitos. Depois de ouvir suas lamentações exasperantes acordei. Confesso que me emocionei ao encontrar com Edmond Dantes (O conde de Monte Cristo). Contou-me sua triste história (que eu já conhecia bem) dizendo que foi condenado por um crime que não cometeu e cumpriu pena em um castelo no meio do mar mediterrâneo durante décadas. Disse também que todos os dias planejava como seria a sua vingança. Aliás, foi uma vingança espetacular.
Impressionante foi o encontro que tive com Raskolnikov (Crime e Castigo) que matou a velha megera e sua irmã mais nova. Vi seu rosto arrependido pelo duplo assassinato... Com o intuito de se defender, me disse que grandes homens como Julio Cesar e Napoleão, foram célebres assassinos absolvidos pela História. Por isso, insiste que não se sente culpado pelo assassinato. Assim, acredita que seu delito é moralmente correto.
Tive outros tantos sonhos com meus personagens favoritos, mas no momento não me lembro. Ah! Lembrei-me agora de Samantha (A boneca de pano) e do poeta-dentista (A passagem dos cometas), mas contarei em breve. Bye!!
Edir Araujo
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Autor de A passagem dos cometas, Risos e lágrimas, A boneca de pano, Fulana (inédito) e muitos poemas, crônicas, contos, microcontos e artigos publicados na web "ad aeternum".