Margarida

Foi na primavera, quando tudo se renova.

Houve um tempo em que por circunstâncias da vida fomos mais próximos e, aos domingos de manhã, embora ela não fosse uma pessoa "televisiva", assim que terminava seu cafezinho preparado com todo amor pela filha, sentava-se na poltroninha da sala junto comigo pra ver televisão. Não prestava muita atenção não; olhar meio distante, penso que o pensamento vagava por outras paragens, outros tempos, outras pessoas "mais reais" que fizeram / faziam parte de sua vida.

A programação era cultural: "Viola minha Viola", "Globo Rural", "missa de Aparecida", "Sr. Brasil". Margarida tinha sempre um comentário ligeiramente irônico quando dona Inezita Barroso aparecia na tela. Um jeitinho de fé ante o arcebispo Dom Orlando Brandes e um olhar de admiração para o Boldrin. Era isso, uma telespectadora distraída, mas que gostava de estar ali, quietinha. Durante o Globo Rural curtia os bichinhos que vez por outra apareciam.

Era uma mulher de seu tempo, uma mulher forte, criou seus filhos com muito carinho e disposição e recebeu todo carinho e cuidado quando o "tempo que requer cuidados" chegou ou quando, parafraseando Renato Teixeira, "as cores foram varridas de seu pensamento" e o mundinho em que ela vivia cercada de ternura definitivamente se transformou.

Partiu de forma branda após viver de maneira simples o tempo que lhe foi concedido pra viver. Sofreu as dores das perdas, sorriu o riso doce das chegadas e vindas. Está no céu.

Guarani MG 1929 / Mauá SP, primavera de 2021

Luizinho Trocate
Enviado por Luizinho Trocate em 05/11/2021
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