Experiência mística ou treinamento para a Esperança
Na sala, a luz se apagou e nada mais vi não.
Uma voz familiar me chamou, era minha amiga Gabriela, colega que foi embora cedo, quando cursávamos a terceira classe na Escola Ozanam. Reconheci logo, porque ela tinha bonitos dentes grandes e olhos muito escuros (acho que pretos) e cabelo fininho.
Pediu-me pressa e me mostrou que podia ir por um caminho de pedras bonitas até meu pai. Fiquei tão alegre. Segui.
Ele estava com uma camisa xadrez azul e com uma calça de linho creme. Cabelos por embranquecer, achei curioso. Sorri e demorei em chamá-lo, para apreender mais, aquela cena.
Quando chamei, ele voltou-se. Deu um sorriso pequeno, de canto de boca, fazendo um movimento pequeno com a cabeça, um pouquinho para trás e para cima, feito sempre fez. Eu fiquei mais alegre.
Abracei meu pai. Chorei e sorri. Durou pouco tempo esse derrame, porque ele disse para eu me aprumar.
Sentamos num banco de bosque, desses de madeira antiga. Quando olhei novamente, ao redor, estávamos na roça mais recente.
Ele pediu-me calma e falou para ser mais esperançosa. Falamos sobre tantas coisas, até sobre aquele dia do carro escorregando na ladeira. Ele disse que achou que ia morrer ali. Sorri, sorrimos.
A seriedade se fez no rosto do meu pai, era hora de voltar. Perguntei se nos veríamos novamente, ele disse que nunca estaremos separados. Nenhum de nós.
Quando acordei, a luz tinha voltado. A TV estava chamuscando aqueles pingos cinza e preto e branco; e a chuva, havia derramado sua braveza nas plantas e nas ruas, nos telhados e na calçada do meu coração.
(Solineide Maria - Duduzinha)
Luanda, 26 de Outubro de 2021.