POCOTÓ, POCOTÓ FAZ O TREM

Que embalo bom. Um cheiro de fumaça negra,

outras vezes branca,invadindo pelas janelas,

e a boca do bucho cuspindo faiscas.

A chaminé sempre bramindo alto.

O forte apito fazia-se ouvir à quilômetros

fazendo piuuuuuui, piuuuuuui, piuuuuui, (chega né?)

talvez procurando uma fêmea.

E como boi brabo, lavai o trem, fincando os cascos

nos trilhos. Rangidos mil pelo seu corpo,

bancos duros de madeira e um cara ao meu lado

me enchendo o saco com conversa fiada.

Era de desanimar!

Mas tinha as paisagens simples das fazendas

pobres, um boi aqui, uma vaca acolá, e também

outras mais abastadas com muita criação.

Tudo era verde, menos a pintura

das roupas no varal, e as

moradias geralmente pintadas de branco.

Aquela árvore lá longe, será um umbuzeiro ou cajueiro?

Ou será pé de pitomba, quem sabe uma mangueira?

O cheiro, silvestre, a paz, vista sem a pressa da capital.

A inchada ferindo a terra pelo lavrador despreocupado,

sem um olhar sequer para a cobra de ferro e madeira,

que fazia uma curva desesperada, comendo carvão

e cozinhando água para manter o vapor, o sangue para

fazer pulsar e impulsionar a maquina, que vive correndo

para levar, e trazer cargas e pessoas. Maquina,

com vida e missão. De no momento chegar à próxima

estação, para um rápido descanso; mas descansar de que?

Gente vendendo coisas para ganhar uns poucos tostões,

cocadas, bolo de puba e de macacheira,

também se vende água para matar a sede dos passageiros.

Uma mulher vai ao sanitário, um homem espera a sua vez

olhando pelo rabo do olho para o guri pulando no banco.

O trem está se movimentando devagar novamente.

Depressa essa menina,

joga o dinheiro do beijú para o menino,

para ele levar pão para casa.

E segue o trem novamente, sem saber para aonde vai.

Eu não nem ligo, comprei uma passagem só de ida,

para encontrar um motivo para sonhar, inspiração

para escrever, ou só para ver a vida passar assim...

sem pensar em nada.

Não sei se voltarei ou se morrerei nos braços de um

amor nunca sonhado, perdido de alguém em algum lugar.

Não quero saber de nada, moro em qualquer lugar,

como o vento a fazer miragens no céu, sem nunca

terminar a jornada.

O trem chegou em algum lugar, que não conheço,

agora devagar sem pressa, esquecido da realidade.

Na verdade não sei se foi sonho ou realidade minha

viagem, no trem de ferro.

Eu fiquei nessa estação, mas ele continuou.

Touro bravo engolindo carvão e arrotando brasas

pelos trilhos do meu sertão.

Salvador, 09/10/2021.

Barrett.