_________ MESA POSTA


À volta da mesa, uma cadeira de cada lado, o olho no olho detona o que  destrona o saudável do dia a dia: cartas na mesa, que mal resolvido é pior que espinha de peixe  na garganta, sem ter por perto uma colher de farinha seca ou um miolo de pão.
Cartas na mesa são difíceis de tragar, mas tão necessárias quanto uma boa dose da melhor vitamina C. No mais, mesa posta é assim, na alegria ou na tristeza, uma faca de dois gumes.

À mesa de minha avó, a lembrança traz um quê de boca calada, que hora da comida é sagrada — sentença difícil de engolir, para quem era criança e tinha diante de si o prato non grato: Ah, como ardia aquela couve apimentada!
Mas e a mesa dos encantos? A mesma que sonhei dividir com meu amor. Exposta ao sol da varandinha, forrada de renda branca, portando a louça bordada, herança da cristaleira de outra avó. Servido o chá com torradas, flanávamos pela romântica refeição, passeando pela música de Chico e nos perdendo na delicadeza  da letra de Valsinha.

 Sim, a mesa é a mesa. A mesma onde meu pai se sentava sempre e nos contava contente seus causos de anteontem. Justo ele, que agora cultiva canteiros de estrelas em campos que não conheço! Mas chego lá. E então nos sentaremos a outra  mesa posta, a nos lembrar de um tempo que era bom, mas nem se compara em beleza e paz a esse outro totalmente novo e eterno.