CHUVAS EM MIM

Chove lá fora. A porta da sala entreaberta. Um ventinho frio, gostoso, passa por ela e toca minha pele ao penetrar pelas tramas do tecido, o qual cobre minhas pernas.

Ouço música: "A Deusa Da Minha Rua", de Newton Teixeira, num CD gravado por mim. Gosto de me ouvir! Ao violão, o amigo, @renancolombosimoes .

À minha volta, caixas e mais caixas de coisas acumuladas ao longo da vida. Coisas que compramos porque achamos úteis ou simplesmente porque gostamos. Outras, guardamos porque ganhamos.

Olho para os móveis que me fizeram companhia nos últimos anos. O que levar, o que não levar para onde vou? Ferida antiga que se abre, pois, há nove anos tive que deixar tudo para trás, na última mudança.

Coloco os pés sobre uma das caixas. Sentei-me para descansar um pouco .

Agora a música é "Viola Enluarada", de Marcos Valle. Ouço-me a cantar (...) "sabe que a paz é passageira" (...). O frio, antes gostoso, percorre e gela a minha coluna. Muitas nuvens me cercam. A chuva, agora, está em mim.

Muito do que está embalado aqui será descartado, em breve. Sei que, mais uma vez, terei que deixar para trás coisas muito importantes para mim. Coisas que, para quem está de fora, são apenas coisas — "apenas um entulho a mais, ocupando um espaço a mais".

No meu coração, ainda há espaço demais para essas coisas que guardam memórias intensas, mas que para quem não as viveu, nada significam. Só eu sei o que vivi, as lutas travadas para conseguir adquiri-las, e a felicidade por tê-las conseguido.

É a "Lei do Desapego" impondo seu cumprimento. Ela é dura, cruel, imparcial! Não dá trégua e executa suas ordens nos momentos em que a fragilidade toma conta de nós.

Aproveita-se do momento em que as perdas nas nossas vidas são mais significativas. Aí ela vem, toda satisfeita, e puxa o tapete de sob os nossos pés, de uma só vez. Rasteira completa!

Só nos resta a misericórdia divina.

A criança, que ainda habita em nós, chora e se entrega. Senta-se... no colo de Jesus!

Feliz Dia das Crianças!

Vila Velha /ES — 11/10/2021

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