CAFÉ PARIS, NITERÓI, ANOS 1920
OS “PARISIENSES” E O MAR I
Nelson Marzullo Tangerini
Em “Mensagem”, Fernando Pessoa escreve que “O mar sem fim é portuguez”.
Vergílio Ferreira, escritor e ensaísta, também português, em “A voz do mar”, Espaço Universal, 5, pp. 83 – 84, Bertrand, Lisboa, Portugal, 1999, escreve que “Da minha língua vê-se o mar. Na minha língua ouve-se o seu rumor como a de outros se ouvirá o da floresta ou do silêncio do deserto. Por isso a voz do mar foi em nós a da inquietação” .
O som do “mar salgado”, “lágrimas de Portugal”, por conta das navegações, desde a era dos primeiros “descobrimentos”, teria dado à nossa língua essa sonoridade, esse barulho inquietante, grave ou sereno, que nos faz navegar através da fala ou da escrita.
Esses quatro poetas do Café Paris , Mazzini Rubano, Renê Descartes de Medeiros, Augusto Mouzinho e Sílvio Figueiredo, que ora trago, para esta crônica, em dois capítulos, são, por certo, herdeiros desta paixão enraizada no nosso DNA, desde o renascimento.
De Mazzini Rubano trazemos ONDA:
“Veio de longe, marulhante, veio
Das majestosas plagas do oceano,
- Depois de um rumoroso desenleio
Tomar um porte altivo e soberano,
Sob a força do vento, que se arruma
Contra os mares e os mares desenfeia -
Histérica, frenética, raivosa,
Numa explosão de lágrimas de espuma,
Atirou-se de bruços sobre a areia”.
De Renê Descartes de Medeiros, o galã da Roda Literária daquele Café, trazemos o soneto HARMONIA BÁRBARA, no qual o sensível poeta nos traz toda a musicalidade de uma sinfonia de Richard Wanger:
“No lírico gingar dos mastros e das quilhas,
Uma nova harmonia espiralava-se no ar...
São notas de volúpia e de amargura, filhas
Do vaivém voluptuoso e irrequieto do mar!
Se a caravela rompe a distância das milhas,
Agitada é a canção, wagneriana, solar,
Mas, se está presa a um cais, por cabos, por presilhas,
Estrangula a canção de gemidos sem par!
São notas desiguais, músicas divergentes,
Tendo origem na dor de duas almas doentes,
Que eu, sentindo, comparo a humanas maravilhas!
Wagner, pelo alto mar, no horror dos temporais,
E o doentio Chopin, na murada de um cais
- no lírio gingar dos mastros e das quilhas!”
Prosseguindo, “em pleno mar”, navegado outrora por Vasco da Gama, Camões, Fernão de Magalhães, Tristão da Cunha, entre tantos outros navegantes, poetas ou não, enveredaremos oceano adentro na poesia dos outros “parisienses” aqui citados. Porque como diz o ditado antigo, “navegar é preciso”.