Aquilo que perdi
“A arte de perder não é nenhum mistério;
Tantas coisas contêm em si o acidente
De perdê-las, que perder não é nada sério.” - Elizabeth Bishop
Elizabeth Bishop tem um poema chamado “A arte de perder”, no qual pode-se perceber que o “ato de perder” relaciona-se com a arte, porque a perda pode ser inexplicável, silenciosa e precisa necessariamente ser aprendida.
Pode ser provável que o poema de Elizabeth Bishop tenha a intenção de mostrar a si mesma que o ato de perder é irrelevante. Ela demonstra um modo de lidar com a perda, “reconhecendo as pequenas coisas que perdemos todos os dias e olhando para o panorama geral da vida e todas as coisas que perdemos que são, objetivamente, não desastrosas (...)”.
Por isso, vou escrever sobre a minha arte de perder. Destarte, por mais que elas sejam desastrosas, ambas contém a arte da perda.
Eu poderia passar muito tempo aqui, afinal, já perdi muitas amizades que eu considerava. Muitas pessoas. Não apenas para a perda natural da vida, que talvez seja em algum sentido mais fácil de aceitar. Às vezes perdi porque simplesmente o tempo separou.
Acho que a principal perda que, talvez, seja a mais dolorosa possível tenha sido meu melhor amigo. Foi uma perda natural, eu não esperava que fosse acontecer, por mais que ele tivesse idade suficiente para isso. Não escrevo muito sobre ele, porque não quero que seja dito os verbos no passado. Como se já tivesse superado. Certamente, eu nunca vou aceitar que ele está apenas no que medito. E, prometo, aqui eternizar. Para nunca o pretérito utilizar.
Com ele, perdi as minhas idas ao asilo. Ninguém nunca me perguntou porque parei de ir, mas eu simplesmente não consigo pisar lá. Eu não consigo nem passar em frente. Eu espero que algum dia, essa arte me faça enfrentar esse luto interminável.
Logo em seguida, perdi meus amigos. Ou pelo menos, aqueles que acreditava que eram. Eu gostava de zoar no grupo e bancar a mãe. Esses dias a minha irmã disse que vou "precisar ter uns 500 filhos para gastar essa energia que tem. Se você tiver só um, eu vou ter dó dele”. Porque, realmente, eu tenho muita energia e nunca tinha reparado nisso. Acho que essa época que perdi me deixou bem claro isso.
Por mais que, muitas vezes, olho com bom olhar para eles, não sinto tanta falta. Sei que cada um seguiu por um caminho diferente e só alguns restaram. Mas, já não é a mesma coisa. Não me sinto bem quando falo com algum deles, então prefiro deixá-los para arte. Que ela cuide de mantê-los bem na minha memória.
Perdi literalmente todos os meus amigos, que acreditava mesmo que eram reais. Não tem um que sobrou e isso é horrível. Passei um tempo lamentando a perda, xingando, depois procurando por eles, depois xingando de novo e, por fim, aceitando. Como disse Caio Fernando Abreu, perder alguém na vida “dói mais fundo - porque se poderia ter, já que está vivo.”. Demora tempo para aceitar essas perdas, mas basta aceitar que as coisas mudaram e seguir.
A arte de perder, também contém em si o renovar. Perder significa necessariamente encontrar novos caminhos, porque se você perdeu o seu, precisará ter algo para substituí-lo. Encontrar outro livro, com outros personagens e escrever outra história. Tive que sair com uma amiga (que tive que reviver também) para fazer pelo menos alguns. Mas nunca é a mesma coisa, você conversa com pessoas e entra em grupos, mas aquele nunca é o seu. Não até torná-lo seu.
Enfim, a experiência de perder é necessária, porque faz parte do caminhar da vida e é, desse modo, que se encontram novas formas de continuá-la.