O Belo em nossas vidas (*)
(*) Nem tudo são flores no Planeta Jardim - Crônicas de um futuro possível
APIABÁ (20.8 S, 47.5 O), 03/09/3.317
Creio que hoje aprendi alguma coisa sobre o papel da arte em nossas vidas.
No passeio dominical, eu, minha esposa e a neta Sibele fomos a uma exposição de artes plásticas que percorre a região e chegou à nossa cidade. Havia lá todo tipo de artefato decorativo. É inimaginável a quantidade possível de combinação de cores, formas, materiais, sons e conceitos. A criatividade humana parece não ter limites.
Já vivi seis décadas e nunca antes tinha visto um festival de artes como este. Sempre tive “coisas mais importantes” a fazer. É certo que, na cidade onde nasci e cresci, as artes plásticas não são tão valorizadas quanto a linguagem universal da jardinagem, a música (até certo ponto), as ritualísticas religiosas. Os poucos artistas plásticos que por aqui nascem acabam mudando-se para comunidades mais receptivas, onde seus espíritos inquietos não provocam tantos muxoxos.
Com a constante preocupação de ser prático e objetivo, me tornei bronco. Felizmente a idade madura nos desobriga gradualmente da luta intensa pela manutenção da vida e, como consequência, podemos olhar “a vida” de fora, ampliando nossa perspectiva.
Apreciando a exposição, inicialmente fiquei apenas encantado com a beleza das obras, ou decepcionado com aquelas que achei sem graça, apesar do evidente esforço do artista. Mas logo percebi que cada obra encerra um sentido que extrapola o objeto em si. Percebi que toda forma de arte começa com uma intensa atividade mental, e tudo o que diz respeito à mente é “contagioso”: quando um pensa, mil pensam junto.
Algumas obras expostas são propositalmente feias. Fiquei intrigado, refleti e percebi que o feio nos choca, porque nos remete ao belo por uma via transversa. O belo é o anseio original da alma humana.
O papel do artista é estimular a criatividade – em todos os campos da organização humana – usando os “sabores e perfumes” da beleza, sem compromisso com a utilidade. A utilidade do objeto artístico é tão somente ser belo, ou interessante, ou intrigante. O objeto artístico não serve para comer, mas alimenta nossos sentimentos e pensamentos.
A arte serve para exercitar e expandir nossa mente além dos limites convencionais. Com ela produzimos a beleza, com a qual tornamos perfeitas a verdade e a bondade. VERDADE, BONDADE e BELEZA são os paradigmas básicos que usamos nas decisões que tomamos, nas escolhas que fazemos, e formam o tripé da evolução humana.
A arte, tanto quanto a educação que recebemos e a religião eventualmente professa, molda e remolda nossa mente, e fortalece a centelha divina da pessoa.
A religião, de alguma forma, nos liga às realidades metafísicas, que alcançamos apenas parcialmente, mediante percepções, linguagens e práticas específicas, e tem sentido durante a vida e após a morte do corpo. A religião age em nosso espírito numa perspectiva atemporal, que vale enquanto caminhamos sobre a terra e também depois que desencarnamos.
A arte, por sua vez, mantém seu foco em nós próprios e em nossa vida terrena. Alimenta e realimenta nossa criatividade, por mecanismos pouco evidentes, e assim renova constantemente a própria civilização. Sem indivíduos criativos, qualquer grupo ou sociedade humana tende à estagnação e, em seguida, à sucumbência. A vida se mantém pela renovação constante.