DEUS. PAZ. ESPERANÇA. NOSSO INTERIOR.
Um homem sábio e iluminado mantinha sua porta aberta a todos. Um dia fechou-a e não mais recebeu quem quer que seja, e todos batiam em sua porta buscando seus ensinamentos novamente sem conseguirem. Recolheu-se ao seu silêncio, à solidão.
Nesse silêncio se apagam ocupações e preocupações, nele se encontra a paz que desertada em vida fútil, luta com distrações amenas ou não, que ao invés de saciarem os sentidos, os deixam em pânico. É o encontro do que não quer o corpo, mas pede o espírito, luta forte e decisiva entre o interior, sua mensagem rica e nobre, e o exterior com todas suas conquistas falazes. Nessa porta se abre o encontro com o Deus de cada um, uno e plural, isocronicamente, colorido em referências singulares, habitando individualidades espargidas para amplidões, o Deus-interior perdido nas conquistas passageiras, expressivas, mas não retribuidoras. Caos dos sentimentos.
Não se trata de fuga, mas de pura realidade, tangentes palpáveis, mesmo só no meio da multidão, mas sensível para ouvir falas diversas, filtrar na bateia do crivo inteligencial a sonorização interior, onde a púrpura nobre que veste virtudes encobre matérias inferiores, e ouve-se os sons vibrarem nas cordas que se fundem no pulsar da lira, apontando a esperança, embora só sua, da promessa de paz em outros espaços.
Viver o silêncio não significa cerrar portas e janelas, estado patológico, viver de vícios e fobias, morrer para o mundo, o que, drasticamente, na ligação com outro mundo, radicalizou o sábio da história que traço; mas era um sábio.
Estar silente, próprio de alguns, não todos, ainda que sábios e santos, não seria somente mergulhar no eu-só como fez aquele que cerrou suas portas para o mundano. Este é um passo radical no encontro do outro lado ainda nesse, o ingresso definitivo no mundo anímico, o qual podemos antever no silêncio e na meditação, como viu Tomás de Aquino e para o que foi chamado Santo Agotinho, livre e leve ainda que no burburinho do movimento e das influências exteriores.
Nada há de fundamentalismo nesse abraço da existência em plenitude, ao revés. Desapegado do ensinamento supérfluo, o sábio quis entrar definitivamente no mundo que era só seu. Não há mais questionamentos, está pleno de paz, direito de escolha, como de monges e religiosos em seus claustros.
Viver o silêncio e o hermetismo não significa fugir do sol, cerrar portas e janelas. Ninguém é anacoreta do nada, nem intérprete do impossível, do intangível, ingresso na ponte do nada ao nunca.
Para se ter luz e encontrá-la caminha-se na escuridão. Em uma enorme sala escura um pequenino fósforo é luz máxima. O sol, a luz, precisam ser vistos, agradecidas suas presenças todos os dias. Muitos querem ver a luz, não conseguem. Cegos não veem e muitos que têm visão fecham as janelas não permitindo sequer que o sol entre em sua sala, em suas almas. Vivem nas sombras e das sombras, trazendo escuridão, contaminando seus próximos que anseiam por luz, levando-os aos grilhões de cárceres indesejados, tornando-os iguais em personalidades enfraquecidas.
Definido o sol, as grandes verdades, cuja posse não temos, dissipadas as sombras, aspiramos a paz definitiva, estando no patamar maior a generosidade da compreensão, e nada mais importa. Somos a folha que vaga no vento levados pela inevitabilidade do acontecimento da vida.