livre, nem tanto.

Gastava uma hora de ônibus até o serviço. Como acordava tarde, por volta de dez horas, e não conseguia almoçar a tempo de pegar o ônibus ele preferia levar a marmita para almoçar no serviço.

Um dia pensou: por que não almoçar dentro do ônibus enquanto não chegava no ponto final que era onde descia para ir trabalhar? Mas logo se lembrou que nunca vira alguém almoçando dentro de um ônibus; ele seria o primeiro. Mas o problema não era esse , o problema era que as pessoas iriam achar isso ridículo e iriam rir dele.

Sentiu como éramos todos escravos das leis que regiam os hábitos sociais e sentiu raiva de tudo e de todos por isso. A liberdade era uma ilusão. A cidade era uma grande prisão onde todos eram os presos e os policiais ao mesmo tempo. Todo mundo vigiando todo mundo o tempo inteiro e o pior: sem perceber que faziam isso. Sentiu raiva de tudo e de todos de novo.

E o almoço? Iria ou não almoçar no ônibus? Imaginou todos olhando para ele como ele fosse um louco que fugira do hospício só por estar fazendo uma coisa que ninguém fazia. Resolveu então enfrentar tudo e todos: amanhã, segunda-feira, iria almoçar dentro do ônibus.

Na segunda-feira preparou sua marmita. Pôs somente macarrão, pois, pensou que seria mais rápida a refeição inusitada. Pensou também que se o motorista desse uma freada e houvesse feijão na sua marmita esse poderia derramar piorando a sua situação. Muito bem estava tudo pronto. Pôs a marmita na mochila juntamente com o lanche da tarde e foi para o ponto pegar o ônibus. Quando já estava sentado, dentro do ônibus, abriu a mochila para pegar a marmita mas não teve coragem.

Que covardia essa sua. Imaginou novamente todos rindo dele e até poderia correr o risco do motorista parar e coloca-lo para fora do ônibus. Resolveu então esperar chegar no serviço para almoçar como fazia todos os dias.Mas prometeu que algum dia iria tentar de novo.E não só almoçaria dentro do ônibus mas também ia escovar os dentes, pois uma hora era tempo de sobra para ele fazer isso. Daria até para comer uma sobremesa ou chupar uma laranja.

Bem o tempo passou e ele , depois de várias tentativas, só conseguiu chupar a laranja. Sua raiva de tudo e de todos até que diminuiu depois desse pequeno ato subversivo, mas iria continuar tentando quem sabe um dia não teria a coragem suficiente para enfrentar a tudo e a todos? "Liberdade de merda essa nossa" - pensou.