Mini crônica: O pé de couve

O pé-de-couve lutava. É verdade que o hortelão lhe dava uma ajudazinha: colocou-lhe uma boa escora e deu uma amarradinha aqui e outra acolá, demonstrando claramente sua piedade para com ele. Colocava também mais estercos para ele do que para os outros pés. Era um bom homem.

Seu caule ressequido e amarelo ,de tão torto, formava um círculo quase perfeito. O hortelão já não se lembrava mais de quantos eram quando a horta era nova. Agora só restavam três e dos três ele era o mais velho, o mais feio e o mais torto.

Mas lutava. Lutava de dar inveja a qualquer um.

Todos os dias, achavam que ele ia cair e morrer. Mas não. Lá estava ele todas as manhãs firme e torto. Nem ele mesmo compreendia porque ainda estava vivo. Mas achava bom. É bom viver — pensava ele. De dia tinha os passarinhos, as flores, as borboletas, o vento, o sol — que o incomodava um pouco por volta do meio-dia, mas de manhã era uma maravilha — , as crianças que vinham brincar na horta. De noite tinha a lua, as estrelas, o silêncio e a música dos insetos. Viver era bom sim.

E lutava! Lutava de dar inveja a qualquer um.