Pequenas histórias 243
Na umidade
Na umidade das mãos escorre gotas de chuva salpicando a carne sonolenta de saudade quando não se sabe do que e nem de quem. Em cada gota há o sorriso perdido do menino encolhido nos lençóis de jornais. Em cada gota o velho trôpego, maltrapilho, enrolado nos amarfanhados trapos da vida, encolhido se arrasta rente à parede como se dele fosse culpa de ser idoso. Há tanta coisa e as coisas que há ficam perdidas nos cantos da casa ao desapego de seus habitantes.
O relógio marca o momento do passado encravado na pele dos objetos mudos e surdos. Obediente, o percurso do tempo, encarcerados em prédios de agonia mórbida, fixados por pigmentos de ácido na tela do medo, representam a palidez de uma época falida. Não há salvação sem desprendimento palpável. Sem ressentimento de qualquer tipo. Sentimento, aliás, não tem vez, não é relevante sua importância diante dos sadismos utópicos enovelando o masoquismo da perda de identidade.
Somos o que somos sem salvação, engolfados no capitalismo vegetativo consumista lutamos para manter a respiração de nadador. Não representamos valores antigos, queremos impor nossos valores desprezando costumes e tradições de cultura sendo jogado no lixo fetos e mais fetos dos nossos fetos apodrecidos na vagina da cidade.
Ao luar cinzento o mendigo ergue sua taça de vinho imaginário e brinda a vida feliz, a sua vida de felicidade.