MARISTELA...DA ROSENTAL
7:50 horas, agosto friorento na minha cidade.
Manhã de sábado e estou bisbilhotando as gôndolas do maior supermercado iratiense.
Uma neblina rala e a sensação de que o inverno aos poucos vai perdendo a densidade.
[ Os primeiros junquilhos em meu quintal sugerem tempos mornos e agradáveis pela frente ]
Observo a babilônia em que se transformou este estabelecimento e retorno a um passado distante quando tudo era apenas um armazém com atendimento no balcão.
Havia uma grande freguesia já naquela época, hoje o mega estabelecimento é também frequentadíssimo.
Vêm -me à lembrança aquelas manhãs - tão parecidas com esta de agora - quando vínhamos de listinha na mão e uma sacola de nylon debaixo do braço, fazer as "compras para o fim de semana", além de algumas futilidades , até porque, já naquela época, ninguém era de ferro.
Tudo servido sobre o balcão, somado "de cabeça" numa folha de papel de embrulho e depois conferido por dona Inês, proprietária do armazém, que ficava numa espécie de púlpito onde funcionava o caixa do estabelecimento.
Era lá do alto que ela vigiava, literalmente, o andamento dos negócios e a produtividade dos funcionários.
Vale lembrar que, apesar de bem idosa, dona Inês administra ainda cada milímetro do atual e concorridíssimo supermercado que lhe pertence.
Mas...Tava eu por ali, tipo chutando latinhas de cerveja, consumindo o tempo de que dispunha até que iniciasse o meu trabalho.
Lá fora , apesar da paisagem ter mudado em muito, a manhã trazia em seu bojo aquelas neblinas ralas dos tempos idos.
Então me vi em meus 11 a 12 anos de idade naquele bodegão que vendia de tudo.
À minha esquerda, os agricultores vindos do interior, bebericando uns goles de canha enquanto degustavam porções de torresmos, salame e linguiça com pão.
O "guajú" era geral e ao longo do balcão,pacotes de arroz, de macarrão,latas de óleo, de molhos de tomate...Iam-se avolumando satisfazendo aos pedidos da clientela.
Cachos de bananas desciam das portas e transportavam-se por inteiro para dentro das carroças estacionadas ao longo da rua Trajano Grácia, de chão batido naquela época.
O imenso balcão que formava um "L", terminava com a seção de armarinhos,e era por ali que eu me satisfazia comprando meias, lenços e cintas que juravam-me ser de couro legítimo.
Um certo dia - era sempre no sábado que o povo dos bairros saía para as compras "na cidade", um atendente, já de uma certa idade vendeu-me uma carteira.
Não satisfeito, e na ânsia de engordar sua comissãozinha, sugeriu-me uma "água de cheiro".
A lábia foi mais ou menos nestes termos.
- "Você está ficando mocinho - observe esta sua voz de ganço novo , de taquara rachada, dos desafinamentos - isso é sinal de que está chegando a...puberdade.
[ Estas palavras foram ditas depois de muito bem analisado se não havia nem uma senhora por perto, e mediante uma inclinação dele - o vendedor - sobre o balcão,para quase cochicha-las aos meus ouvidos]
E foi completando...
E, um mocinho...Precisa arranjar uma namoradinha...E...Cheirosinho, a coisa fica mais fácil , entende ? rsrs...
Sugeriu-me um perfume "bom e barato".
"Colonia Maristela, da Rosental"
I r r e s i s t í v e l !!! Vende às pencas !
Abriu o frasco e permitiu que eu aspirasse o cheiro.Confesso que gostei.
Comprei logo duas unidades.
De volta pra casa, pelos carreirinhos de mato, me lambuzei da "Maristela" e aquele cheiro que evocava manhãs de primavera ganhou –me no papo e assim fui me sentindo ao lado de uma namorada imaginária que para minha alegria, adorava o cheiro.
Feliz e assobiando, cruzei os capões de mato e o sol já dava sinais das 10 horas, quando cheguei na casa de tia Nena à quem eu adorava.
Assim que cruzei o portão, tia Nena com toda a doçura que Deus lhe havia conferido , comenta:
-Nossa ! Thute ! Como você está cheiroso. Lembra até aquele jardim da casa de sua avó.
Devo ter ficado vermelho, encabulado,mas sorri agradecido.
Tomei um cafézinho e segui o rumo de casa.
A primeira namorada só apareceu muitos anos depois e , a colonia "Maristela...da Rosental" , presumo ,nem mais existia.
Mas foi marcante, me encheu de sonhos, coloriu meu mundinho de piá de bosta com pente no bolso traseiro.
Agora...
Já na rua, a caminho do trabalho, fui pisando o chão neblinado deste início de agosto.
Em pensamentos, a memória olfativa retrocedeu no tempo e juro que senti aquele cheiro com que demarquei meus territórios de aventuras púberes, de voz esganiçada - tipo gancinho novo, taquara rachada... - sonhando amores pelos carreirinhos do mato de ontem, transformados em cidade nos dias de hoje.
Havia um certo encantamento naqueles meus pisares tão docemente saudosistas.
7:50 horas, agosto friorento na minha cidade.
Manhã de sábado e estou bisbilhotando as gôndolas do maior supermercado iratiense.
Uma neblina rala e a sensação de que o inverno aos poucos vai perdendo a densidade.
[ Os primeiros junquilhos em meu quintal sugerem tempos mornos e agradáveis pela frente ]
Observo a babilônia em que se transformou este estabelecimento e retorno a um passado distante quando tudo era apenas um armazém com atendimento no balcão.
Havia uma grande freguesia já naquela época, hoje o mega estabelecimento é também frequentadíssimo.
Vêm -me à lembrança aquelas manhãs - tão parecidas com esta de agora - quando vínhamos de listinha na mão e uma sacola de nylon debaixo do braço, fazer as "compras para o fim de semana", além de algumas futilidades , até porque, já naquela época, ninguém era de ferro.
Tudo servido sobre o balcão, somado "de cabeça" numa folha de papel de embrulho e depois conferido por dona Inês, proprietária do armazém, que ficava numa espécie de púlpito onde funcionava o caixa do estabelecimento.
Era lá do alto que ela vigiava, literalmente, o andamento dos negócios e a produtividade dos funcionários.
Vale lembrar que, apesar de bem idosa, dona Inês administra ainda cada milímetro do atual e concorridíssimo supermercado que lhe pertence.
Mas...Tava eu por ali, tipo chutando latinhas de cerveja, consumindo o tempo de que dispunha até que iniciasse o meu trabalho.
Lá fora , apesar da paisagem ter mudado em muito, a manhã trazia em seu bojo aquelas neblinas ralas dos tempos idos.
Então me vi em meus 11 a 12 anos de idade naquele bodegão que vendia de tudo.
À minha esquerda, os agricultores vindos do interior, bebericando uns goles de canha enquanto degustavam porções de torresmos, salame e linguiça com pão.
O "guajú" era geral e ao longo do balcão,pacotes de arroz, de macarrão,latas de óleo, de molhos de tomate...Iam-se avolumando satisfazendo aos pedidos da clientela.
Cachos de bananas desciam das portas e transportavam-se por inteiro para dentro das carroças estacionadas ao longo da rua Trajano Grácia, de chão batido naquela época.
O imenso balcão que formava um "L", terminava com a seção de armarinhos,e era por ali que eu me satisfazia comprando meias, lenços e cintas que juravam-me ser de couro legítimo.
Um certo dia - era sempre no sábado que o povo dos bairros saía para as compras "na cidade", um atendente, já de uma certa idade vendeu-me uma carteira.
Não satisfeito, e na ânsia de engordar sua comissãozinha, sugeriu-me uma "água de cheiro".
A lábia foi mais ou menos nestes termos.
- "Você está ficando mocinho - observe esta sua voz de ganço novo , de taquara rachada, dos desafinamentos - isso é sinal de que está chegando a...puberdade.
[ Estas palavras foram ditas depois de muito bem analisado se não havia nem uma senhora por perto, e mediante uma inclinação dele - o vendedor - sobre o balcão,para quase cochicha-las aos meus ouvidos]
E foi completando...
E, um mocinho...Precisa arranjar uma namoradinha...E...Cheirosinho, a coisa fica mais fácil , entende ? rsrs...
Sugeriu-me um perfume "bom e barato".
"Colonia Maristela, da Rosental"
I r r e s i s t í v e l !!! Vende às pencas !
Abriu o frasco e permitiu que eu aspirasse o cheiro.Confesso que gostei.
Comprei logo duas unidades.
De volta pra casa, pelos carreirinhos de mato, me lambuzei da "Maristela" e aquele cheiro que evocava manhãs de primavera ganhou –me no papo e assim fui me sentindo ao lado de uma namorada imaginária que para minha alegria, adorava o cheiro.
Feliz e assobiando, cruzei os capões de mato e o sol já dava sinais das 10 horas, quando cheguei na casa de tia Nena à quem eu adorava.
Assim que cruzei o portão, tia Nena com toda a doçura que Deus lhe havia conferido , comenta:
-Nossa ! Thute ! Como você está cheiroso. Lembra até aquele jardim da casa de sua avó.
Devo ter ficado vermelho, encabulado,mas sorri agradecido.
Tomei um cafézinho e segui o rumo de casa.
A primeira namorada só apareceu muitos anos depois e , a colonia "Maristela...da Rosental" , presumo ,nem mais existia.
Mas foi marcante, me encheu de sonhos, coloriu meu mundinho de piá de bosta com pente no bolso traseiro.
Agora...
Já na rua, a caminho do trabalho, fui pisando o chão neblinado deste início de agosto.
Em pensamentos, a memória olfativa retrocedeu no tempo e juro que senti aquele cheiro com que demarquei meus territórios de aventuras púberes, de voz esganiçada - tipo gancinho novo, taquara rachada... - sonhando amores pelos carreirinhos do mato de ontem, transformados em cidade nos dias de hoje.
Havia um certo encantamento naqueles meus pisares tão docemente saudosistas.