Neuza

Ela comia encostada na pia ou se sustentando apenas nas próprias pernas. Não se permitia sentar para almoçar e nem para jantar...e nem em qualquer outra refeição.

Dizia estar acostumada e acredito que de fato estava.

Casou-se (!) aos 13 anos.

Teve filhos e acho que nunca soube o que era ser dela mesma, o que era pertencer a si mesma, ter vontade própria, dar vazão aos desejos, até pq creio que a esta altura já não os nutria mais.

Era nova. Nem 40 anos.

Gordinha (já obesa na verdade), os dentes já rareavam, o cabelo bem curtinho pra não exigir nenhuma dedicação de tempo.

Ela não tinha tempo. Nunca.

Só podia viver para trabalhar e sustentar seus filhos, sua mãe doente.

Seu marido tinha outra família e provavelmente dividia seu parco salário de pedreiro entre as duas.

Ela sabia, mas não podia reclamar senão apanhava e seus filhos ficavam tristes.

A sua própria tristeza aprendera a engolir, numa vida que nunca se mostrou amistosa.

Seu filho mais velho que ela queria muito que fosse "alguém na vida" dividia seus dias entre uma clínica de reabilitação para dependentes químicos e uma tentativa de conseguir estudar .

O caçula, seu xodó, tb tem problemas. É autista.

A vida decididamente não quis sorrir para esta mulher.

Lis Holanda
Enviado por Lis Holanda em 31/07/2021
Código do texto: T7311048
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