A Coerência da Hipocrisia Social
De toda sorte de bêbados que podemos encontrar na sarjeta social, a categoria que mais sofre com as chagas de sua condição é a do "bêbado matinal" (permitam -me a classificação). Este, ao contrário dos outros, parece ser o único que chama alguma atenção, que atrai algum olhar, que se faz percebido (não de maneira positiva, é claro).
"Olha lá, benhê, o senhorzinho bêbado logo cedo"
"Meu Deus, logo cedo a pessoa bêbada!? Como consegue!?"
"Mal começou o dia e o fulano tá lá, tropeçando".
Assim segue a linha de raciocínio, quase que uníssona, a condenar aquela atitude legando-a ao fogo eterno do juízo social!
Mas, e o bêbado de fim de expediente? Ah, ele só passa nos barezinhos descarregar o stress. Quanto ao bêbado de fim de semana ? Ele suportou a semana, merece um descanso. O bêbado pós discussão passional? Depois de discutir com o cônjuge, uma cachaça sempre resolve!
Mas, e o bêbado matinal? Não tem desculpa! Não importa suas frustrações, não importa seus motivos, suas faltas, suas necessidades. Não importa nem se ele tem um lar! Só o que importa é que ele tá "bêbado logo cedo(!?)" (como brada a população).
Assim, os "bêbados convenientes", que pela manhã estão sóbrios, seguem para seus trabalhos, em suas bicicletas ou carros apontando o desgraçado na calçada: "que vergonha, bêbado logo cedo..."
Tal é a "coerência da hipocrisia social", cheia de paradoxos, cheia contradições, simpática ao que convém, aversiva ao que não convém. Porém, sempre hipócrita!
Autor: Igor Carneiro