DESEJOS LITERÁRIOS.
Há dias em que eu chego do trabalho com todo o pique para ler e escrever, fazer isso é aquilo outro em meus textos e rascunhos. Geralmente traço vários planos literários no caminho para casa, ideias e mais ideias que surgem repentinamente... Mas... Basta adentrar nos domínios de meu lar, e todo o meu planejamento se desfaz como um castelo de areia que a onda derruba.
Há dias e dias. No entanto, ainda alimento a utópica ideia de que viverei exclusivamente da minha escrita, pura ilusão eu sei. Logo volto a realidade que me cerca e me condena dia após dia. Realidade esbofeteando minha face de que sou um simples operário do sistema, na sua laboriosa atividade universal de todos os dias. Por muitas vezes busco uma única linha de escrita, a metade de um parágrafo qualquer, um lampejo de inspiração que seja, porém, tudo é silêncio, quietude, e as palavras desaparecem no obscuro da minha mente.
Não é falta de inspiração, nada disso, tão pouco bloqueio literário, não é o caso. O que acontece de verdade é a falta de tempo mesmo, sim, falta de tempo. É a tirania do relógio se impondo em minha vida uma vez mais.
Tenho alguns trabalhos em andamento, romances parados, original de contos, outros projetos a passo de tartaruga. Uma poesia aqui é outra ali que vou ganhando entre uma escrita e outra. O que tenho de constante mesmo na escrita são as crônicas semanais, como nessa em que estou trabalhando no presente momento. Crônicas que busco toda semana, com ou sem inspiração, conhecida entre os cronistas como literatura sob pressão.
Nesse ínterim tem as minhas leituras, essas sim são religiosamente todos os dias.
Leio bastante, tenho devorado muitos livros, neste ano, temas específicos. Um de meus defeitos que passou a ser também qualidade é de que não consigo ler um único livro por vez, sempre tenho que ter dois ou mais na alça de mira. Eu sempre procurei achar tempo onde ele não está, afinal, não consigo ficar sem escrever ou ler, é impossível, ainda que seja uma linha ou ler uma página que seja.
Também há aqueles dias em que os meus personagens estão por demais rebeldes, briguentos, questionadores de tudo... É uma loucura aqui na minha cabeça. Eu digo para um deles; 'Faça isso', ele não obedece, e digo para o outro; 'Morra', ele simplesmente não quer morrer. É bem complicado de entender essa questão de ter outras personalidades literárias e personagens habitando em si, dividindo espaço em nosso universo ficcional. Pode parecer assustador essa coisa de ter tantas pessoas dentro da gente; parece doidera, mas não é, poder habitar neste mundo de fantasia, irreal, e um terrível privilégio.
Não posso deixar de dizer que todo escritor é um bom observador da vida alheia. Escrever é a arte dos covardes, dizemos depois o que deveríamos ter dito na hora. Gostamos de espiar, escutar, fazer parte da nossa rotina criativa e absorver do nosso meio situações que posteriormente serão devolvidas em histórias.
O meu desejo mesmo é de ser escravo da literatura. O cansaço sempre atrapalha meus projetos, roubando o vigor da vontade literária. Porém... Tudo o que é bom também pode ser ruim. Afinal, o veneno está justamente na quantidade.