Anjo sem asas.
Iraci aos 35 anos ficou viúva com duas filhas: de três e cinco anos.
A moça precisou superar-se para manter-se com as meninas.
Por trabalhar fora como ajudante de costureira, agora sozinha sem ter com quem deixar as meninas, começou a trabalhar em casa e logo por conta própria.
A vida seguia apertada, mas em menos de um ano conheceu Luiz, rapaz negro que também ficara viúvo com um filho de seis anos.
Logo se casaram o que foi bom para todos, exceto para o menino que, Iraci não gostava e a quem sobrecarregava com os afazeres mais desagradáveis.
O menino negro, franzino e assustado fazia tudo que a madrasta mandava sem nunca queixar-se, mas jamais a contentava.
Conhecidos, vizinhos e parentes eram testemunhas dos maus tratos que a madrasta impingia a criança, mas ninguém tinha coragem de interferir.
O menino foi instruído a não pedir nada, nem comida. E também a não aceitar coisas de estranhos sobre pena de castigos corporais.
Em 1960 Jair, com 12 anos perde o pai subitamente e a madrasta logo o emprega em uma Mercearia.
A criança vai da escola para o trabalho, só voltando a casa pra dormir, muitas vezes, sem jantar.
O menino triste faz amigos, se aplica nos estudos e sonha conquistar vida independente.
Aos 20 anos Jairo se forma em Contabilidade e vai trabalhar em um Banco, e por sugestão da madrasta, vai morar em uma Pensão com outros rapazes. Dois anos depois passa no concurso do Banco do Brasil e lá conhece a sua futura esposa.
Os anos passam, as filhas de Iraci se casam e a senhora continua a trabalhar, muitas vezes, para ajudar no sustento das filhas, genros e netos.
Aos 82 anos é internada em um asilo. As filhas dizem que a casa é pequena...
Filhas e netos de dona Iraci raramente a visitam, mas Jairo lá está todos os domingos para lhe fazer companhia, levar-lhe frutas, guloseimas e oferecer-lhe cuidados.
Aos 92 anos dona Iraci está em seu leito de morte e Jairo lhe toma as mãos. Ambos se olham sem palavras. No entanto, seguidas lágrimas brotam de um par de olhos.