VASTO MUNDO
VASTO MUNDO
Será que crescer significa transpor o seu interior ao exterior? Hoje já não me meço por centímetros, mas pela quantidade de ilusões e desilusões agregadas a mim. E é nessa cidade em (des)conserto que as obras se estendem aos homens sem ajuste algum. Talvez o tempo tenha tentado enganar sua existência. Contradição que as máquinas fazem crer. Quanto mais comunicação girando em pessoas estáticas, mais monossilábicos ficam. Há aqui um paradoxo que exige que sejamos concisos em consonância com o exacerbado número de informações. É melhor calar?
Forma-se matéria bruta para o trabalho de psicanalistas que reconhecem por trás de rostos comuns um conglomerado de psicopatas. Entre sorrisos há uma alegria desertada. Na multidão, Josés se perguntam “E agora”? Mas a festa ainda nem começou...
Não há mais pedras no meio do caminho para alertar que as nossas retinas estão deveras fatigadas. Para que tanta perna? Se os nossos ombros suportam o mundo, então por que nos pergunta se trouxemos a chave? Sim, há necessidade de penetrar surdamente no reino das palavras, porém como escrever poemas em meio a buzinas, celulares, miséria, e-mails – são anjos tortos que andam pela vida em busca de uma perna chamada amor.
Meus olhos se convertem no estômago que resulta num refluxo. São regurgitações da náusea cotidiana. Indigesto mundo vasto mundo. Faróis que sinalizam a perda do nosso horizonte de sentido. Para esquerda, para a direita? Onde estão os meios?
Não é a lua nem o conhaque fonte de comoção, são os olhares mais lentos. Nós esbarramos no cotidiano, cercado de mesmice e automatismo. Já disse e insisto em ser um pragmático-romântico, mas não um romântico-pragmático. Há amores práticos?
Praticidade no amor é quando o sentimento é descartável. Porém, não concebo amor se este não for reciclável. Eu me entorpeço da angústia se não me for tomada uma dose de humanidade diária. E me contradigo quando digo que, ao mesmo tempo em que a amo, eu a abomino. Até onde posso dizer que sou autêntico, se quando abraço alguém de lado não vai junto um todo? Ser todo é uma impossibilidade porque estamos constantemente sendo fragmentados e edificados pelos lutos e lutas diárias.
Eu me vejo retraído a cada vez que uma lágrima maior se defronta com a minha. Como posso mensurar meu sofrimento, se perco a noção de quantas vezes reconheci no outro as minhas efemeridades? Cada vez que deparo com um assassinato, com uma perda simbólica, também me vejo reduzido na minha condição humana. Ou será um processo de conscientização do quanto somos vulneráveis? Vivo por saber...
“Sei que canto e a canção é tudo. Tem sangue eterno a asa ritmada. E sei que um dia estarei mudo: mais nada”. Faço dos versos de Cecília Meireles os meus. Mas é difícil aceitar o silêncio. Nosso silenciamento. Então, só nos resta cantar enquanto possível for.