“O velho sub”
A gratidão de, no fim de carreira, perto de ir para a reserva, era marca daquele militar. Os companheiros de círculo hierárquico classificavam – no como um “viva marinha!’’. Cearense de nascimento, nosso caro sub Heleno, alcançou um patamar restrito a poucos. E tinha muita gratidão a Deus e ao destino, uma gratidão por ter alcançado, no serviço ativo, o ápice como praça: nem todos conseguem alcançar por maior que seja o esforço e a dedicação. O sub Heleno era um militar que, ao ouvir o que ouvia, o que dizia a guerra dos irmãos de armas, tinha para ela um elogio pessoal. E comentava com a boyzada que seu conceito foi ser um homem realizado.
- Lembrem sempre que vão falar, exaltar o SAM, Serviço Ativo da Marinha, que lhe permitiu chegar ao ponto máximo da carreira. Ainda respondeu que era o “rei dos cachorros”, se fizer a prova para o oficial cito seria boy outra vez. O sub muito se apetecia em ser o que era: o mais antigo dos praças. O comentário é que o leão era implacável com seus proventos. Teve um contador excelente para cuidar do patrimônio e também de sua declaração de renda. Quer dizer mais responsabilidades e pouco reconhecimento por parte dos oficiais. O sub já pensando nisso pretendeu ficar com o mais antigo dos praças. Além do mais, seu destino é navio e já estava batalhando para regressar à Esquadra, onde seria o senhor mestre, conforme reza a OGSA. Ordenança Geral do Serviço na Armada.
-Lembrem – se, boyzada! De falar, exaltar o ambiente naval. Eu, publicamente, sempre falo que a “Briosa” me proporcionou momentos e experiências impares!
Quando procurava nas reminiscências sempre tinha histórias que, no seu pensamento, só o presidente da República teria igual. No convívio o sub, ainda solteiro, dizia que agora aos quarenta e sete anos começaria uma promissora carreira como escritor quer de contos quer, tendo como fundo, a faculdade de jornalismo. Daí decidiria se iria para a imprensa televisiva, radiofônica ou imprensa. Um sonho de menino lá no Cariri, que neste instante, já depois de velho, teria condições financeiras de arcar. Já estava agora faltando tão pouco tempo para vestir o pijama, que resolveu viver, já que conhecia inúmeros países e condições materiais como um transporte, o sub Heleno tinha transporte para escolher ou o Scort amarelo, recém saído da fábrica, ou uma Harley Davidson, estacionada bem direitinho na garagem do primeiro Distrito Naval. Agora poderia ventilar a ideia de casar.
-Boys, vocês gostariam de conhecer a Europa, a América do Sul, Central e | ou Estados Unidos, bem como a China e o Japão? Quer pelo Oeste quer pelo leste navegando por oceanos Atlântico, Pacífico. Ou Índico. Entre outras aventuras, o mar Mediterrâneo em situação de agitamento, com altas e fortes ventos...Se este for algum dos seus planos conhecer, a Marinha tem condições de proporcionar, tá certo que com uma paga em suor e trabalho, mas vejam se é isso o que vai realizar na vida.
Era por um jovem marinheiro na parede, pois eram necessários o sonho e a vontade de trabalhar duro. Só dava para quem era aventureiro, mas trazendo consigo uma disciplina a ser lapidada ao correr dos anos, a vontade de servir a Pátria. Era esse o alvo! O sub Heleno sabia muito bem disso, mas, uma ou outra, trazia para bordo consigo. Álbuns de fotografia, um vasto material a ser apreciado pela boyzada, juntamente com as medalhas conseguidas, ao longo da recompensada carreira. O sub trazia com muito gosto, porque sabia que tudo aquilo poderia produzir um discípulo. Lá iria ser uma semente plantada no coração do jovem e germinar, e crescer e dar frutos. Sem esquecer que era uma escolha pessoal.
- Ah! Tá que essa viagem pelo nosso vizinho quer pelo Atlântico quer pelo Pacífico! Pela Constância, comecei a ver que eram nosso quintal, antes de irmos à Europa e ou à Ásia. Digam, sinceramente, se não seria o sonho de muito jovem por aí? O que os meus filhos estudam na escola, eu já vi com os meus próprios olhos e nunca achei motivos para murmurar: dar a vida pela Pátria. Quero ver, se no futuro, acharei um discípulo. Mas quero que entre para a Marinha pela parte da frente: a Escola Naval ou, então, o CIAGA, o centro de Instrução Alte. Graça Aranha ou o CIABA, do qual só conheço pela sigla.
Aquilo enchia o coração daquele sertanejo! Seus olhos brilhavam a cada recordação, reminiscências oculares que seus filhos viam e estudavam nos livros. Tudo aquilo puro fruto de memórias vivas. Realmente os marinheiros se entusiasmavam com o que lhes era passado. Mas ainda haviam as perguntas capciosas, das quais o velha guarda saía pela tangente.
- Sub, o senhor como se virava sem falar inglês?
Calmamente o sub, dizia aos curiosos, atentos ao que lhes seria respondido.
- Vocês, virão perceber o mesmo que eu notei diante desse entrave: a linguagem do e a do comércio são universais! Principalmente ao redor do portos e dos bordéis.
A resposta acalmara à fervura da hora, a quaisquer outros comentários que poderiam surgir. E tal como um professor, à frente de uma sala de aula, passava o recado... Se o estudante ia aproveitar era algo do conteúdo. Só ele (aluno) poderia tomar como incentivo e responder. Afinal, Jesus foi negado três vezes, entrou num barco e acalmou as ondas do mar em fúria, fez um discípulo, que seria a pedra da sua igreja, tanto se molhar, quando tentou chegar ao mestre e depois chorar ao inquirido se o amava por três, antes de convencê – lo que seria um pescador se homens. Quem seria o sub Heleno para afirmar que fariam carreira. Ele, além de passar o exemplo tinha o dom do camareiro. Era o livre arbítrio. A Marinha lhe apresentou várias situações, ao longo da carreira, e ele nunca poderia ter certeza de nada. Como ia imaginar que alguém como ele, fosse chamado para responder uma falta que não fora sua, assumindo a culpa de outrem e com uma descompostura que nem mesmo marinheiros como aqueles poderiam levar de um oficial. Isso causou uma repercussão em toda a Diretoria de Administração da Marinha, inclusive, na máquina xérox onde os militares e funcionários civis se reuniam para bater um papo, enquanto esperavam o fim do serviço que levaram até lá.
- Deixa pra lá! Ele ainda me chama em particular, num ambiente mais propício e vai me pedir desculpas,” assim pensou mas não aconteceu, tão logo saiu do banheiro, local a que recorreu para urinar, assim que o superior o liberou.