ALÉM DA COMPETIÇÃO

A L É M DA C O M P E T I Ç Ã O

Durante séculos, o homem habitou um planeta sem fronteiras nem escrituras, e as propriedades eram marcadas com urina, desenhos nas rochas e até mesmo, restos mortais de animais de grande porte, para exibir a capacidade de luta do suposto habitante do pedaço.

O homem dividia com outros animais, a água, os frutos, os peixes e outras fontes de subsistência, mas não havia exatamente uma competição entre eles, pois o homem, com sua inteligência aguçada estava tão mais preparado para disputar estes bens, que com certeza, levou a melhor. Mas, talvez essa vantagem tenha despertado no homem o gosto pela vitória, uma vez que quase sempre vencia seus oponentes, fosse pela força ou pela inteligência, e seu prêmio ia desde o prazer de ser o vencedor até a admiração da tribo, reconhecendo neste, um guerreiro, o qual tinha as honrarias pertinentes.

Com o passar do tempo, a evolução e multiplicação da espécie, essa disputa ficou tão desigual, que o homem já não dispunha de animais para vencê-los e ganhar seu galardão, a pesca ficou escassa e os frutos naturais insuficientes.

Então mais uma vez, o homem usou sua inteligência e começou outra espécie de luta, ou seja, produzir todo ou parte de seu sustento, fixando-se desta forma em áreas propícias, onde houvesse bons abrigos, terrenos férteis para o plantio e certamente água. Para tornar isso possível, não bastava urinar nas arvores ou nas pedras, a demarcação tinha que ser mais eficiente, chegando até a verdadeiras fortalezas.

O nível de disputa já não é mais com outros animais, os guerreiros agora lutam com seus semelhantes, na pseudodefesa de seu território ou conquistando o território vizinho.

Quando duas tribos tinham forças semelhantes e corriam os riscos de destruição mútua, promoviam um casamento entre um membro de cada uma, e assim somavam suas forças e devastavam todo o mundo conhecido nas vizinhanças; usavam tudo que era conquistado em bens e pessoas, dando origem a primeira forma de escravidão, onde incluíamos basicamente gente de outras tribos ou países. Já nesta época, o homem aprendeu que somar esforços em vez de concorrer, multiplica a capacidade de competição, a ponto de não ter concorrente capaz de vencê-lo. Por outro lado, se não há lutas não há vitórias, e o prazer de ganhar prêmios começa a fazer falta e ele sente uma necessidade incontrolável de novas conquistas, que o destaque perante sua tribo, e esta força desmedida leva-os a competir em lugar de ajudarem-se.

Por muitos séculos, a competição foi apenas uma forma de alguém se destacar perante a comunidade, ou uma comunidade, representada por um grupo de seus cidadãos, desarcar-se perante outras comunidades. Com a revolução industrial, aconteceram dois fenômenos sociais distintos e contundentes, para nossa forma de vida atual:

1- Para criar consumidor, libertaram os escravos na modalidade antiga. Aquela modalidade incluía escravos formado de gente estranha ou vencida, que apesar da condição de submissão total, tinha garantido trabalho, casa, comida e saúde. Aquele escravo que, apesar de tudo, tinha sonhos e o maior, logicamente, era poder ter a liberdade de escolher seu próprio destino, inclusive voltar para os seus;

2- O homem foi induzido a ser empregado de uma indústria ou empresa de grande porte, em detrimento de seu negócio particular ou de sua lavoura etc. Para isso criou-se o estigma de que para se ter status e ser um verdadeiro cidadão, devemos ter um bom cargo, carro, casa em um bairro chique etc.

No princípio não se exigia muito conhecimento, e até mesmo os analfabetos conseguiam uma boa colocação. Com o passar do tempo e a necessidade de melhorar a produtividade, houve duas evoluções simultâneas: O aprimoramento da tecnologia, e a outra, conseqüência da primeira, o aprimoramento dos conhecimentos práticos e acadêmicos, para podermos lidar com ela.

Nos dias atuais, o sistema de seleção do pessoal, considerando apenas o nível de conhecimento exigido para se ingressar no corpo funcional de uma organização, supera a caça de um urso ou coisa parecida em termo de competição, e aquela competição que antes servia tão somente para destacá-lo perante a sociedade, hoje é uma das poucas ferramentas de sobrevivência.

Este processo de existência é calcado numa nova forma de escravidão, onde o homem não tem mais garantia de trabalho, casa nem comida e muito menos saúde, e o pior de tudo, é que o homem perdeu a capacidade de pensar de outra forma, se não dentro deste eixo de servidão.

A maior diferença entre a antiga forma de escravidão e a que vivemos agora, é que antes nos transformávamos estranhos vencidos em combate ou delinqüentes que burlavam as leis, em escravos; hoje, transformamos nossos filhos, e o pior é que nesta nova concepção de escravatura, temos que educá-los com determinação e corretamente dirigidos, para terem condições de arranjar um emprego, e não para ter uma vida fundamentada em um alto nível de discernimento.

Para as empresas sobreviverem, modernizam seu sistema de gerência, reduzem o número de vagas, aumentam a produtividade, melhoram a qualidade de seus produtos com o mesmo preço ou até menor; mas exigem um trabalhador altamente qualificado, e para garantir seu lugar em uma delas, você tem que estar além da competição.

Além da competição é o estado ótimo de preparação, que coloca o homem ou sua empresa numa posição privilegiada em relação ao seu competidor, seja na execução de uma tarefa elementar, seja na confecção de um produto acabado e posto nas mãos do consumidor.

Só quando atingimos este nível existencial, podemos ter um pouco de segurança, em relação a uma sobrevivência digna, mas para mantê-lo temos que nos aperfeiçoarmos a cada instante, e tudo isso, é o maior fator de stress da atualidade.

(Texto extraído do livro SOCIEDADE VIRTUAL de Jacó Filho)